O ex-presidente Lula acaba de conceder uma entrevista ao jornalista Reinaldo Azevedo, autor de O País dos Petralhas, no programa O É da Coisa, da Band FM. O programa foi transmitido pela internet e atingiu quase 300 mil views simultâneos no seu pico só no Youtube. Uma catarse. Além do rádio e da internet, a Band News, canal a cabo da TV Bandeirantes, também transmitiu o evento.
Sim, foi um evento. Algo que se um marciano que saiu da terra há uns dois anos voltasse hoje imaginaria estar em outro planeta. Ou seja, algo se moveu.
Azevedo se tornou um dos maiores críticos da Lava Jato e defensores da inocência de Lula no processo de lawfare que o ex-presidente foi submetido. A entrevista de hoje sela um movimento de uma parte do centro e da direita liberal que até outro dia criava uma falsa equivalência entre Lula e Bolsonaro.
E esse movimento pode causar consequências. Tanto para essa direita liberal como para um futuro governo liderado pelo PT.
Lula foi pra cima de Bolsonaro, o chamou de ignorante, disse que ele precisa parar de falar besteiras e passar a ouvir quem entende de economia e medicina, defendeu que o mercado comece a prestar atenção na vida do povo, sinalizou que está disposto a caminhar para o centro se vier a ser candidato, falou que o Estado não precisa ser empresarial, que pode abrir empresas públicas para investimentos privados e só não falou que aceitaria Luiza Trajano como sua vice, porque neste momento, a ansiedade de Azevedo não deixou ele terminar sua frase.
Lula também não perdeu o momento para mandar um sinal claro de paz para os donos de meios de comunicação. Citou um a um os grandes barões da mídia e disse que teve ótima relação com eles quando foi presidente. Fez gestos mais amigáveis ainda ao dono da Band, Jonny Saad. A quem elogiou por defender que a Lava Jato não poderia ter acabado com as empresas.
Em muitos momentos, Lula repetiu o que já disse em entrevistas anteriores como a esta Fórum, mas é importante que tenha dito nisso que ele chamou de “embate entre pessoas que pensam diferente, mas que podem se respeitar da maneira mais democrática do mundo”.
Lula vinha até os últimos tempos conseguindo espaço para falar apenas com a mídia independente profissional e com grandes veículos internacionais, a entrevista de hoje tem o potencial de abrir espaço para que outros meios de comunicação, em especial as TVs que são concessões públicas, passem a ouvir Lula.
É imperial que isso aconteça.
Lula fez bem em ir ao É da Coisa e se mostrou firme e forte para ser o grande candidato de uma parcela maior do que a esquerda tradicional em 2022.
Entre outras frases que marcam este recado de Lula para o empresariado está o de que se o mercado tivesse juízo iria até Aparecida do Norte para fazer promessa para Lula voltar.
A entrevista vale mais pelo seu simbolismo do que pelo que possa se extrair dela de novo. Ganharam os dois. Azevedo pela forma respeitosa como tratou o ex-presidente. E Lula, pelas portas que abriu.
Vale como destaque desse novo ciclo, o fato de Azevedo ter imitado Lula e o de o ex-presidente tê-lo chamado de companheiro Reinaldo Azevedo.
O tal marciano de fato não ia entender nada. Mas isso abre uma nova porta para que os passos democráticos contra Bolsonaro não precisem ficar mais pensando em encontrar um caminho do meio quando se tem uma pessoa tão preparada para construir a transição do Brasil que vai ser entregue para um novo mandatário em 2023.