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O ex-prefeito de São Paulo, Fernando Haddad, está no Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo do Campo (SP), onde também estão outras lideranças do PT, do PSOL, de movimentos sociais, sindicatos e milhares de militantes. O campo progressista de São Paulo se reuniu às pressas logo após a notícia do despacho do juiz Sérgio Moro determinando que Lula se entregue até amanhã (6) na Polícia Federal de Curitiba. A ideia é permanecer em vigília em sinal de resistência e apoio a Lula, que também está no local.
Em entrevista ao blogue, Haddad afirmou que em um futuro próximo a população vai se envergonhar do dia de hoje. "Tá saltando aos olhos de boa parcela da população que esse processo é todo político, e que Lula pode ser, sim, considerado um preso político", avaliou.
Confira a íntegra da entrevista.
Renato Rovai - Haddad, qual sua avaliação deste episódio?
Fernando Haddad - O que começou muito mal, a tendência era terminar mal. Vamos fazer um breve retrospecto. Todos os institutos jurídicos, do direito penal, foram de alguma maneira subvertidos. Condução coercitiva desmotivada, delações sem entrega de provas, constrangimento a testemunhas, uma narrativa artificialmente construída para criminalizar uma pessoa contra a qual não havia nenhum indício, ato de ofício indeterminado... Agora um habeas corpus negado numa afronta à constituição reconhecida pelo voto de minerva. Toda uma narrativa que vai num futuro muito breve envergonhar a todo o país. Tudo para tirar uma pessoa de uma disputa presidencial. Tá saltando aos olhos de boa parcela da população que esse processo é todo político, e que Lula pode ser, sim, considerado um preso político, um perseguido político.
Renato Rovai - E quais as consequências pro país dessa atitude envolta em tantas ilegalidades e arbitrariedades?
Fernando Haddad - Eu acho correta a dupla estratégia do PT de acreditar na via institucional, acreditar que em algum momento um tribunal superior fará justiça, analisando criteriosamente o mérito. Por outro lado, Lula e o PT estavam fazendo uma mobilização com as caravanas, com atos públicos, reuniões de juristas, livros, artigos.
De um lado, tentar reforçar a todo custo as instituições republicanas, que não estão agindo republicanamente, e de outro alertar parcela significativa da população que tem algo de muito errado acontecendo no Brasil. Um impeachment sem crime de responsabilidade, uma condenação e uma prisão sem provas, tudo isso é muito equivocado. Acredito que temos que manter essa militância institucional e popular.
Renato Rovai - Falando em militância, o que você recomenda à militância e o que você acha que deve ser feito nesse momento tão decisivo da história do PT, do país? O Lula deve se entregar? Já avaliou esse processo?
Fernando Haddad - Eu acho que isso é uma decisão muito pessoal do Lula. Estamos falando de um indivíduo que está vivendo as consequências do arbítrio. Essa é uma decisão, na minha opinião, até de foro íntimo. Temos que estar preparados para dar suporte ao Lula, qualquer que seja a decisão que ele tomar, ele não pode se sentir isolado de maneira nenhuma, tem que ter sua liderança reafirmada a todo momento, de que ele tem todas as condições de disputar a presidência por ser inocente, por eles não terem conseguido provar nada contra ele, e que portanto ele tenha seus direitos políticos reconhecidos e assegurados para disputar o próximo pleito presidencial. De outro lado, acho que temos que transformar isso num momento cívico, porque a insegurança jurídica criada nesse cenário é muito grande. As pessoas que têm uma visão mais progressista, que estão lutando pela transformação do mundo para melhor, todas estão muito inseguras com as arbitrariedades que podem ser cometidas contra cada um de nós a qualquer momento. Esse processo tem que ter um freio para que as instituições funcionem com base na igualdade de direitos de qualquer cidadão brasileiro. Então, de um lado, é dar o respaldo e o apoio ao Lula como indivíduo, como cidadão e como liderança, e de outro, transformar isso em um movimento cívico. "Lula Livre" não pode ser uma expressão vazia, tem que ser uma expressão carregada de conteúdo político.
Renato Rovai - Você acha que essa prisão do Lula do jeito que se deu, atropelando processos, inaugura um novo momento do golpe?
Fernando Haddad - Sem dúvidas é um divisor de águas. Realmente, repito, num futuro muito próximo o país vai reconhecer como um dia vergonhoso. O país vai se envergonhar disso. É muita arbitrariedade. É uma construção desse processo, carregado de artificialismos que estão ficando cada vez mais claro aos olhos da opinião pública. Não podemos aceitar que a justiça só venha no longo prazo, temos que fazer alguma coisa imediatamente. Temos que transformar isso num movimento cívico, num movimento cívico democrático, pois é de arbítrio que estamos falando.
Foto: Lula Marques