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Havia gente de "esquerda" dizendo que nós que defendemos o creative commons somos liberais. O editorial de O Globo de hoje esclarece as coisas. E os lados. Segue a visão de que entende de que lado deve ficar. O Globo não brinca em serviço. Lendo este editorial me lembrei da frase da minha querida avó Conceição: "diga-me com quem anda e te direi quem és.
Visão maniqueísta sobre o direito autoral
A legítima e correta decisão da ministra da Cultura, Ana de Hollanda, de retirar do Congresso o ainda pouco discutido projeto de mudanças nas regras do direito autoral deflagrou um processo maniqueísta de acusações que só fazem obscurecer ainda mais este necessário debate. Não importa que o projeto tenha sido apresentado à audiência pública, pois as dúvidas que ainda pairam sobre o tema justificam o ato da ministra.
É possível que, na raiz de tudo, esteja o fato de o MinC, nos últimos anos, ter sido um dos mais aparelhados ministérios da Era Lula, usado como instrumento da visão dirigista, intervencionista e estatista que sentou praça em Brasília desde 2003. Não se podem esquecer as nítidas impressões digitais deixadas por esta ideologia arcaica nos projetos da Ancinav - agência idealizada no MinC para, entre outros objetivos, controlar o conteúdo da produção audiovisual -, e de revogação da Lei Rouanet, de incentivo fiscal à produção artística e cultural.
Assim, qualquer revisão ou crítica a decisões deste grupo - minoritário no próprio PT, mas bastante ativo - é denunciada como ação "neoliberal", "conservadora". Balela. Basta listar os nomes de artistas e intelectuais preocupados com o rumo imprimido ao assunto pela última administração do MinC para se constatar a impossibilidade de se rotular críticos do projeto com base em modelos usados no discurso pobre de panfletos partidários.
Tentar transformar este imprescindível debate num fantasioso choque entre "direita" e "esquerda" é querer interditar a discussão sobre tema fundamental: o direito do autor de decidir o que fazer com o fruto do seu trabalho intelectual, sem qualquer interferência do Estado.
É inaceitável a relativização do direito autoral, mesmo que seja justificada pela importância "social" da obra. Ressalve-se: não confundir a defesa do autor com o descabido monopólio que herdeiros e descendentes de personalidades públicas exercem sobre a biografia destas pessoas, a ponto de contrariar o direito constitucional à liberdade de expressão.
A revisão de regras do direito autoral ocorre em momento delicado, em que a revolução patrocinada pela internet, ao mesmo tempo em que multiplica ao infinito a circulação e acesso a arquivos de textos, som e imagem, coloca em xeque o controle do autor sobre a sua produção.
Este conflito ganha gigantescas proporções no jornalismo, no qual as empresas geradoras de conteúdo têm sido solapadas pelos chamados agregadores de notícias, usuários deste conteúdo sem remunerar os produtores - como se apurar, processar e difundir informações não fosse uma custosa operação.
Inegável que o mundo virtual da internet abre incontáveis possibilidades para músicos, escritores, artistas plásticos, etc. Há quem distribua gratuitamente sua música, por exemplo, para melhorar o cachê no mercado de shows. Ou aceite mecanismos novos como o Criative Commons, para difundir obras, mesmo que abra mão da integralidade de seus direitos de autor.
A decisão de Ana de Hollanda de recolocar em discussão o projeto ajudará na preservação do princípio inegociável de que o autor tem de ser soberano na administração de sua obra