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Carnaval de rua... Está aí uma novidade que não é mais tanta novidade em São Paulo e muitas outras cidades brasileiras.
Ele andou sumido por muito tempo. E voltou com tudo. E mais: com gente pulando e cantando.
Com exceção de alguns lugares, como a Vila Esperança, carnaval de rua em São Paulo nunca teve muita animação. Tinha muita gente nas ruas, mas poucos cantando e dançando, parecia mais que estavam passeando.
Nos meus primeiros anos em São Paulo, fechavam um trecho da avenida São João e ficava gente andando pra lá e pra cá. De vez em quando passava algum “maluco” cantando e dançando, e tinha gente que olhava como se aquilo fosse espantoso.
Presenciei também um “corso” na avenida Brasil. Eram carros conversíveis andando vagarosamente, com pessoas de pé dentro deles, jogando confete e serpentina nos outros carros ou em quem andava a pé na calçada ou no meio dos carros.
Aqui, e em quase todas as médias e grandes cidades brasileiras, tinha muito carnaval de salão, geralmente em clubes. Nunca fui, mas me falavam muito da animação do carnaval no Juventus e não sei onde mais.
Não sei se ainda existe carnaval de salão aqui. Nunca mais ouvi falar, parece que sumiu de vez. Muita gente preferia o carnaval de salão por ser considerado mais “família”, digamos assim.
Mas em alguns casos era mais ostentação.
Houve carnavais de salão famosos, como os do Teatro Municipal e do Hotel Glória, do Rio de Janeiro, frequentados por milionários, com concurso de fantasias luxuosas.
As revistas O Cruzeiro e Manchete traziam páginas e páginas, a Fatos e Fotos chegava a fazer edições especiais sobre esses carnavais. Publicavam muitas fotos de páginas inteiras de um pessoal que desfilava com fantasias que custavam mais do que pobre ganhava em muitos anos de trabalho. Clóvis Bornay era um sujeito desses, que gostava de se fantasiar com coisas que faziam referência as minas do Rei Salomão, Rainha de Sabá, faraós ou coisas do gênero. Foi o mais famoso dessa turma, ao ponto de virar “hors-concours”, não concorria mais. Só se exibia.
Era um desfile de exibicionistas, e imagino que não tinha graça nenhuma. Claro que nunca vi um mas, mesmo sendo um moleque, achava um troço totalmente besta. Mas certamente tem quem tenha saudade disso.
O que sempre gostei foi do carnaval de rua, dos chamados blocos de sujos. Participei de alguns. Um deles foi em Parati, com um bando de pescadores e estudantes daqui de São Paulo. Depois participei de um bloco em Olinda, num bloco que varou a noite. Mas não era tanta gente como hoje. Há alguns anos estive em Angatuba, pequena cidade paulista com um grupo muito ativo e animado.
Lá por 1981 ou 82, quando jovens de São Luiz do Paraitinga resolveram peitar um padre que “proibia” o carnaval na cidade, criamos o “Peida n’Água”, que compartilhava com outros blocos uma cantoria dançante pelas ruas da cidade. O canto era no gogó. Nada de aparelhos de som. No sábado de manhã, compúnhamos uma marchinha na chácara de um amigo, a uns oitocentos metros do centro da cidade, e saíamos cantando e dançando. Na saída da chácara, éramos umas quinze ou vinte pessoas, mas o bloco ia engrossando e chegava à praça com umas duzentas ou mais pessoas.
Um ano decidimos: em vez de marchinha, bolero! Fomos cantando o bolero “Maria Helena” e dançando (em pares, como nos bailes) até o centro. Foi divertido.
Só que o carnaval de lá foi ficando grande demais e uns anos depois caí fora. Vou muito a São Luiz do Paraitinga, e gosto, mas não no carnaval.
Bom... Desfile de escolas de samba também é nas ruas. Mas não tem muito a ver com o que considero “carnaval de rua”. Embora o desfile seja um espetáculo grandioso e bonito, acho monótono e pouco divertido ficar olhando escolas que se repetem. É muito formal. Tem um pessoal rico que fica em camarotes, mais para se exibir do que para se divertir. E até pagam fortunas para artistas internacionais se exibirem em alguns camarotes, para aparecer como propaganda de cerveja na mídia.
Salvador tinha um carnaval que eu gostava, o trio elétrico, mas eles ficaram grandes demais e para participar dele, passou a ser preciso comprar uma roupa que antes era barata e se chamava mortalha, agora chama-se abadá e custa caro.
E tem uma equipe de segurança enorme, separando com uma corda, quem tem o abadá daquele trio elétrico de quem não tem. Só quem pagou uma grana pelo abadá tem o direito de acompanhar dentro da área dos privilegiados.
Repito: bom mesmo, pra mim, sempre foi o bloco de sujos.
Um grupo sai anarquicamente, cantando e dançando, e entra nele quem quer. Geralmente eram blocos pequenos.
De uns três anos pra cá, houve uma explosão no carnaval de rua em São Paulo. Centenas de blocos. E nem chegou o carnaval ainda. Um mês antes as ruas já foram tomadas por multidões. Imagino como será o carnaval mesmo! Nada contra, mas eles não têm o lado anárquico dos blocos de sujos. E reúnem milhares de pessoas. Fico perdido no meio de tanta gente (coisas de velho, dirão. Tudo bem).
Eles têm licença da prefeitura, roteiros pré-traçados, horário para acabar e até patrocínio de empresas. É um carnaval disciplinado.
Vendo esses blocos enormes que tomam conta de várias ruas, inclusive na Vila Madalena, onde moro, fico me lembrando de quando voltei a morar em São Paulo, depois de uns tempos fora.
Fui trabalhar num prédio da avenida Paulista e, num final de tarde, ouvi um batuque não muito afinado, vindo da rua. Abri a janela e vi um pequeno bloco de sujos. Fiquei animado, mas logo caí na risada: o bloco parou no sinal vermelho!
Bloco de carnaval que obedece semáforo? Coisas de São Paulo, pensei. Quem podia imaginar o carnaval que hoje toma conta das ruas paulistanas? Só que já estão tocando até rock no carnaval. Certo! Se tocamos e cantamos bolero no bloco do “Peida n’Água”, por que não podem tocar outros ritmos? Aí tem o rock. Coisas do Brasil de hoje. Em termos de sucessos desse “Brasil de hoje”, a opção sertanejo universitário não é melhor. Não mesmo!
Foto: I Hate Flash