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Tenho me lembrado bastante de Darcy Ribeiro, sujeito que sempre admirei muito, por suas ideias e causas pelas quais lutou com garra e sem trégua. E também pelo modo de ver e interpretar as coisas. Por exemplo, ele sonhava com um Brasil poderoso e justo, e dizia: “Temos um povo maravilhoso e uma classe dominante horrorosa. Precisamos dar lição a ela, mostrar que é possível construir esse país”.
Era defensor dos índios, da educação e da cultura brasileira, além de grande escritor e apaixonado pelo Brasil.
É dele o texto do projeto que criou o Parque Nacional do Xingu em 1961. Foi um dos criadores e primeiro reitor da Universidade de Brasília, com um projeto inovador, interrompido pelo golpe de 1964, que fez aquela instituição passar durante anos sendo dirigida por reitores retrógrados, ao gosto dos governos militares. É dele também a criação, quando vice-governador do Rio (o governador era Leonel Brizola), dos Cieps, para pôr em prática educação integral para todas as crianças.
Escreveu muitos livros excelentes, desde tratados antropológicos até romances com temáticas indígenas, como “Maíra”, publicado em 1977, que se tornou tão popular que muita gente apaixonada por ele deu o nome Maíra às suas filhas.
Com o golpe de 1964, se exilou no Uruguai e depois andou por vários países da América Latina, criando universidades.
Não o deixavam voltar para cá de jeito nenhum, até que, com câncer, foi desenganado pelos médicos. Queria morrer aqui e pediu permissão aos militares para vir. Permitiram. Chegou à beira da morte em 1976, mas a volta ao Brasil o revigorou, foi quase uma cura: só foi morrer em 1997. De câncer mesmo. Teve tempo para fazer muita coisa.
Sua última obra foi o livro “O povo brasileiro”, publicado em 1995, em que esbanjava elogios ao Brasil e ao povo brasileiro, valorizando sempre a miscigenação, a mistura de índios, negros, brancos e quem mais viesse para cá.
Nesse livro, ele diz: “Na verdade das coisas, o que somos é a nova Roma. Uma Roma tardia e tropical. O Brasil já é a maior das nações neolatinas, pela magnitude populacional, e começa a sê-lo também por sua criatividade artística e cultura. Precisa agora sê-lo no domínio da tecnologia da futura civilização, para se fazer uma potência econômica e de progresso auto-sustentado. Estamos nos construindo na luta para florescer amanhã como uma nova civilização, mestiça e tropical, orgulhosa de si mesma. Mais alegre, generosa, porque aberta à convivência com todas as raças e todas as culturas e porque assentada na mais bela e luminosa província da Terra”.
Às vésperas de morrer, disse para jovens que faziam um documentário sobre ele que sentia “dó” porque não veria a grandeza do Brasil consumada como queria e previa. Morreria antes. E completou: “Ficam vocês encarregados de fazer esse país. Mas façam! Sem copiar ninguém! Seremos uma das grandes civilizações desse mundo”.
Mas o que mais me faz lembrar dele neste momento que passamos, de muitas agruras, foi uma “autoavaliação” que fez: “Fracassei em tudo o que tentei na vida. Tentei alfabetizar as crianças brasileiras, não consegui. Tentei salvar os índios, não consegui. Tentei fazer uma universidade séria e fracassei. Mas os fracassos são minhas vitórias. Eu detestaria estar no lugar de quem venceu”.
Foto de capa: Reprodução