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Imagine a história de um rapaz, mal passando da adolescência, que sonha ser um grande jogador de futebol.
Consegue jogar na equipe juvenil de um grande time, disputa um torneio da categoria com mais de cem times do Brasil inteiro, é campeão, entra na fila para receber sua merecida medalha e na hora H, cadê a medalha? Sumiu. Ficou sem. Frustrante, não é?
Parece ficção, mas aconteceu. Foi numa Copa São Paulo de Futebol, vencida pelos jovens do Corinthians. Um dos jogadores ficou sem a medalha! Como? Por quê?
Uma câmera de vídeo desvendou o segredo: ela gravou José Maria Marin, cartola da CBF, roubando a medalha e colocando no bolso do paletó. Que vergonha!
Ao ver isso, pensei: um sujeito desses é do tipo capaz de tomar doce de criança e roubar esmola de cego.
Esse é um exemplo singelo da cartolagem do futebol brasileiro. E não é só ele. Cartolas de futebol, na grande maioria são cheios de mutreta.
José Maria Marin, além de cartola, é ou foi político, como aliás são ou foram outros mutreteiros. Usam o futebol em benefício de suas carreiras.
Pode-se dizer que Marin é um exemplo extremado disso. Um mau cartola e mau político. Muitos atribuem a ele a responsabilidade pela morte do jornalista Vladimir Herzog, em 1975.
Marin era deputado estadual. Wadih Helu, outro cartola simbólico, também era. Dirigente do Corinthians, ele se elegia deputado com votos dos torcedores e atuava sempre a favor da ditadura. Num discurso de Wadih Helu na Assembléia Legislativa, Marin aparteou e pediu que os militares a intervenção no departamento de jornalismo da TV Cultura, dirigido por Herzog. Dias depois, Herzog foi preso e morto no DOI-Codi, órgão de repressão política do governo.
Marin nunca teria votos para se eleger para algo além de deputado estadual. Espertamente, agiu nas sombras: foi vice-governador de Paulo Maluf e assumiu o governo quando o titular renunciou para se candidatar a deputado federal, depois foi vice de Ricardo Teixeira na CBF e assumiu presidência quando Teixeira, cheio de suspeitas, resolveu deixar a entidade.
Pois é, agora se revela o que todo mundo sabia: a cartolagem do futebol não é uma desgraça só no Brasil. Parece que a Conmebol, a Fifa e todas essas entidades que mexem com muito dinheiro estão cheias de Marins. E, claro, aí não faltam os empresários do ramo, intermediando negócios, manipulando, dando e cobrando propinas.
A denúncia de que rolou propina grossa para a escolha da Rússia para sediar a Copa de 2018 e a do Catar para 2022 começa agora a ser levada a sério. Aliás, até a escolha do Brasil para a Copa de 2014 já é vista como suspeita.
Não duvido de que tenha ocorrido nos três casos, mas o Brasil, pelo seu histórico futebolístico, merecia. Não merecia a corrupção que rolou para a realização da Copa. A Rússia, pelas dimensões do país e um futebol razoável também não é uma escolha ruim. Podem dizer que não há lá um futebol que justifique, mas em 1974 também não havia nos Estados Unidos, e fez-se a Copa lá com a justificativa de que ajudaria a popularizar o futebol no país. E em 2002 não havia futebol que justificasse também a realização da Copa no Japão e na Coreia.
Mas a escolha do Catar extrapolou. Só mesmo a propina ampla, geral e irrestrita pode explicar a escolha desse país que tem a metade da extensão do estado de Sergipe, a população menor do que a do município de Fortaleza, e nenhum futebol. O esporte mais popular do país é a corrida de camelos, com torcedores fanáticos acompanhando inclusive pela televisão.
São poucas as cidades do Catar: Doha, a capital, tem cerca de 800 mil habitantes, e mais da metade da população do país. Depois dela, tem Al-Rayan, pertinho de Doha, com menos de 460 mil habitantes e em seguida há mais duas cidades de tamanho médio, Al-Khawr, com 200 mil e Al-Wakrah, com 142 mil habitantes. O resto são algumas cidades pequenis e o deserto.
Quase todos os estádios devem ser feitos na capital, Doha, e seu entorno. E a temperatura, em junho e julho, chega a perto de 50 graus. Denúncias de trabalho em regime de escravidão na construção dos estádios viraram rotina e não acontece nada. Muitos operários levados de outros países para trabalhar nas construções relacionadas à Copa e só em 2012 e 2013 morreram quase 900 indianos e nepaleses nas obras e isso não implica em nenhuma ação punitiva, a não ser protestos da Anistia Internacional. Há denúncias de que muitos querem voltar para seus respectivos países, mas seus passaportes estão nas mãos das empreiteiras. Aqui, a morte de dois operários num acidente de guindaste quase paralisou as obras do estádio de Itaquera.
Entre os países que concorreram com o Catar estava a Austrália, que não tem grande futebol mas tem cidades com condições de sediar os jogos, como Sydney e Melborune com mais de quatro milhões de habitantes, Brisbane com mais de dois milhões, Perth com quase dois milhões, Adelaide com mais de um milhão e várias cidades relativamente grandes. Além disso, seria a primeira Copa na Oceania. Quem sabe implicaria num avanço do futebol da própria Austrália, da Nova Zelândia e uns países menores?
E havia outros países competindo, com capacidade de realizar um bom evento esportivo, inclusive os Estados Unidos.
Mas preferiram o Catar...
Conheço um espírita que diz que o Brasil está numa fase prevista há muito “no mundo espiritual”, de purgação para o surgimento de um novo país, melhor e mais justo, uma verdadeira “nova civilização”. E o mundo também, segundo ele. Bom, não sou espírita, mas estou quase concordando com meu conhecido. Aqui temos visto a justiça começar a funcionar, pelo menos em alguns casos.
Fora daqui, o mundo balança na Europa, por exemplo. Lá, o que acontece é uma chacoalhada política, por causa da crise econômica. Há denúncias de corrupção, mas sem prisões. Agora vem essa onda de esclarecimentos de safadezas no mundo esportivo, com prisão de parte dos corruptos. Mesmo que consigam se safar, não conseguirão mais enganar ninguém, serão malvistos onde forem. É uma grande novidade.
Será que a purgação do planeta vai começar pela moralização do mundo do futebol? Sem ironias, peço aos espíritas que me expliquem.