Ontem o Ministério da Educação após se reunir com Alexandre Frota soltou a seguinte nota:
. Foto: Isabelle AraújoO Ministério da Educação informa que o ministro Mendonça Filho tem como prática atender às solicitações de audiência, assim como dar retorno aos contatos recebidos. O ator Alexandre Frota está em Brasília e ligou para fazer uma visita de cortesia. O ministro o recebeu entre uma audiência e outra. “Não discrimino ninguém, porque respeito a liberdade de cada pessoa fazer suas escolhas de vida. Conheci Frota no movimento pró-impeachment, assim como o pessoal do Revoltados On Line. Não vejo problema em recebê-los para uma visita”, afirmou. Nestes primeiros dias no Ministério, o ministro teve uma extensa agenda para tratar de temas diversos: recebeu o ministro da Saúde, Ricardo de Barros, o prefeito de Salvador, ACM Neto, educadores para discutir ensino técnico, básico, superior e Enem. Além disso, abriu sua agenda para visitas de cortesia de amigos, personalidades e artistas, como o forrozeiro Alcimar Monteiro, o ator Odilon Vagner e o produtor do Festival de Cinema do Recife, Alfredo Bertini
O ministro do governo interino não vê qualquer embaraço em receber Alexandre Frota, Marcelo Reis do Revoltados online ou representantes da 'Escola sem Partido', um famigerado projeto que defende o fim de disciplinas como a Filosofia e Sociologia; a mordaça de educadores em sala de aula, a retirada de autonomia do professor para que esse não cumpra seu papel estabelecido pela LDB na formação de cidadãos comprometidos com a cidadania, a defesa dos direitos humanos e para que atuem criticamente na sociedade.
No texto escrito especialmente para o Maria Frô, a educadora Cláudia Dutra explica os problemas de um governo provisório e ilegítimo que ao longo de 13 dias vem promovendo uma barbárie multidimensional na área econômica, política, da seguridade social, do respeito às leis aprovadas pelo Congresso Nacional e da ética.
Curvando-se à 'ideologia do estupro'
Por Cláudia Dutra, especial para o Maria Frô
Ontem o país ficou chocado com o estupro de uma jovem por 30 homens (filmado e divulgado) e também com o fato do ministro da educação reunir com Alexandre Frota e o líder do grupo fascista Revoltados Online para discutir educação.
O que esses fatos têm em comum? Tudo. Vou apontar alguns argumentos nesse sentido. Primeiro, a violência contra a mulher persiste na sociedade e a educação é um espaço central de construção da coletividade, de valores humanos, e isso requer desconstruir estereótipos e diversos preconceitos de gênero. Portanto, à escola compete cumprir a lei Maria da Penha e inserir com destaque no currículo as questões de gênero e, para tanto, ao MEC cabe fomentar estudos capazes de apoiar educadores no debate e superação da opressão histórica das mulheres.
Segundo, em uma de suas primeiras audiências, o ministro preferiu receber àqueles que apoiaram o golpe e que são conhecidos por incitar o ódio e divulgar as ideias dos chamados "Brasil livre", "escola sem partido", que sob pretexto de eliminar o caráter ideológico do ensino, insistem na tese de que professores (as) não podem falar de determinados assuntos, como política, gênero, diversidade sexual e outros, ignorando as contribuições das ciências sociais e políticas para a humanidade.
Terceiro, para além das controvérsias que existem em torno da suposta "ideologia de gênero", que exige de nós um posicionamento frente ao grande retrocesso que representa para o conhecimento e sua contextualização no ambiente escolar, é grave o fato do ministro ter recebido tais propostas das mãos de um ator em decadência que passou a buscar mídia escrachando os direitos humanos e que revelou em rede de TV ter estuprado uma pessoa (rindo e ridicularizando as mulheres), ou seja, confessou um crime. Crime esse que foi aplaudido pela platéia e que se repetiu ontem quando um estupro coletivo foi divulgado impunemente pelos criminosos.
Por tudo isso podemos afirmar a relação entre a violência contra as mulheres e o desserviço de um gestor da educação que ao invés de se apropriar da discussão dos planos de educação, da gravidade da situação de violência contra jovens universitárias, entre outros, prefere acenar sua complacência com propostas que concorrem para um processo de fascistização da sociedade.
A educação não pode calar diante diante da violência, da discriminação, do preconceito, curvando-se à "ideologia do estupro".
*Claudia Pereira Dutra, professora e ativista dos Direitos Humanos