Até o PSDB recuou sobre PL4330, mas Aécio, entre outros udenismos, quer rasgar a CLT

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Aécio completa sua conversão ao udenismo e achincalha de vez a memória de Tancredo Neves[1]

Ignacio Godinho Delgado, via e-mail

21/04/2014

O dia 21 de abril representa muito para todos os brasileiros, em especial os nascidos em Minas Gerais, pelo registro das mortes de Tiradentes e Tancredo Neves.

Ligado ao PSD e depois ao MDB e PMDB, Tancredo ficou conhecido como um político liberal, de inclinação conservadora e grande capacidade de conciliação, mas destacou-se, também, por posições firmes na defesa da democracia e no combate ao golpismo, típico da prática política da UDN, adversária do campo político criado em torno de Vargas, representado pela aliança PSD-PTB. Basta lembrar sua atitude em 23 de agosto de 1954, quando, ministro da Justiça de Vargas, na última reunião ministerial antes do suicídio do presidente, pregava a resistência contra a ação golpista que se avolumava, com apoio de boa parte da imprensa brasileira, na qual já atuavam as mesmas famílias que controlam ainda hoje os principais veículos da mídia do Brasil, de onde partem as principais ações contra a continuidade do governo de Dilma Rousseff.

Apesar de seu perfil conservador, em toda a trajetória política de Tancredo Neves, não consta também qualquer iniciativa contrária ao legado trabalhista e nacionalista de Vargas. Junto ao golpismo, a oposição a tal legado marcaria a trajetória e a identidade da UDN, em seu combate sem tréguas a Vargas e àqueles que entendia serem seus herdeiros. Incapaz de alcançar a presidência pelo caminho das urnas, clamou seguidamente pelo golpe, contra Vargas, Kubitschek e Goulart. O centro de seu discurso era o combate à corrupção, cortina de fumaça a envolver a oposição ao trabalhismo, denunciado como demagogia e populismo, e à política nacionalista de Vargas.

Durante e depois das eleições de 2014, Aécio Neves passou a utilizar-se do discurso e do  vocabulário da UDN, inclusive a famosa expressão mar de lama, de Carlos Lacerda, além de estimular ações claramente golpistas, como as iniciativas no TSE para impedir a diplomação e a posse de Dilma Rousseff, e a agora anunciada disposição defender o impeachment da presidenta eleita. Não importam o aeroporto de Cláudio, a distribuição de verbas públicas para rádios da família, o aparecimento do nome de Aécio Neves na Operação Lava Jato... O discurso da velha UDN e de seus herdeiros atuais não tem nada a ver com suas práticas. É apenas um recurso para inciativas golpistas, ancorado na complacência da mídia, cuidadosamente seletiva nas denúncias de corrupção.

Desde o ano passado Aécio Neves tem se posicionado contra o regime de partilha na exploração do Pré-Sal, defendendo o retorno do regime de concessão, preferido pelas grandes companhias ocidentais. Naquele que é, pois, o tema mais importante da disputa atual entre nacionalismo e entreguismo, Aécio ficou mais uma vez com os herdeiros da UDN.

Em 16 de abril passado, Aécio pronunciou-se a favor da primeira versão do PL-4330, que propõe ampliar a terceirização no Brasil, de certa forma deplorando o recuo do PSDB sobre a questão. Embora tenha votado em peso a favor do PL-4330, os tucanos, diante da repercussão negativa nas redes sociais e das manifestações contrárias das ruas, buscaram acertos inclusive com o PT para modificar o projeto. Aécio não! Aécio quer o PL-4330 original, que rasga de vez a CLT, complementando melancolicamente sua conversão plena ao udenismo.

Apesar de construir sua carreira política à sombra de seu parentesco com Tancredo Neves, Aécio passou a representar a expressão mais reacionária, na cena brasileira atual, dos herdeiros dos principais adversários do avô. A memória de Tancredo Neves não merece.

Em 21 de abril, os brasileiros e mineiros evocarão em suas lembranças os nomes de Tiradentes e Tancredo Neves. Infelizmente, junto a eles, não há como esquecer de Joaquim Silvério dos Reis e de Aécio Neves.

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[1] Ao abrir o Brasil 247 hoje, deparei-me com texto de André Singer com ideias parecidas. É para agregar, pois. Ver Singer, A. “Aécio esquece Tancredo e encarna o corvo Lacerda”.

* Professor de História e Ciência Política na Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) e pesquisador do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia-Políticas Públicas, Estratégias e Desenvolvimento (INCT-PPED). Doutorou-se em Ciência Política pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), em 1999, e foi Visiting Senior Fellow na London School of Economics and Political Science (LSE), entre 2011 e 2012.