Criatura e criador: a cartilha neoliberal de FHC reeditada por Aécio Neves

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Aécio não nega o berço, anda com saudades de quando o Brasil devia para o FMI, critica o fortalecimento do Brasil com o banco do Brics, diz com todas as letras que se colocará a serviço do capital internacional. Nada de políticas sociais, nada de aumento de salário mínimo, nada de trazer médicos cubanos pra atender os pobres que nunca haviam visto um médico na vida.

Aécio vive cuspindo as lições da cartilha neoliberal de FHC e promete, se eleito, que o Brasil vai voltar a ficar de joelhos para os Estados Unidos.

Professor Wagner Iglecias ao analisar as últimas declarações de Aécio mostra que não se pode acusar a criatura de FHC, Aécio Neves, de um candidato que esconde o jogo, ele é explícito em seu entreguismo. 

Aécio, um candidato franco

Por Wagner Iglecias, especial para o Maria Frô

21/07/2014

Pode-se criticar Aécio por muitas coisas, mas pelo menos ele não esconde o jogo. Há alguns meses ele declarou que se eleito vai tomar "medidas impopulares", provavelmente convencido de que é preciso fazer um ajuste nas contas do governo e que este trará, inevitavelmente, perdas. No caso, ao povo. Por uma escolha política, obviamente. E quais seriam estas perdas? Desemprego? Redução do crédito subsidiado? Corrosão do salário mínimo e do poder de compra? Não se sabe. Mas a declaração foi feita.

Aécio tem em Armínio Fraga, ex-presidente do Banco Central durante o governo FHC e hoje em dia um muito bem-sucedido operador do mercado financeiro, aquele que talvez seja seu principal conselheiro em matéria de economia, e provavelmente um dos mais destacados formuladores de seu programa de governo na área. Em recente entrevista ao Estadão Armínio mostrou-se preocupado com a atual situação fiscal do governo, falou em autonomia do Banco Central, racionalização da atuação dos bancos públicos, privatização de infra-estrutura, relacionou ganhos reais do salário mínimo a “engessamento do mercado de trabalho” e criticou a atual política externa brasileira, na visão dele distante “das grandes locomotivas mundiais” e próxima de regimes autoritários e exóticos. Aécio não o desmentiu.

Por falar nisso, em política externa, Aécio se mostra francamente favorável a um alinhamento com USA e União Européia, como bom tucano que é. Em postagem feita em sua página oficial no Facebook, nesta 2ª feira, por ocasião de encontro com o presidente da Comissão Européia, o conservador José Durão Barroso, Aécio foi mais uma vez direto: “Reiterei minha convicção de que estamos atrasados com a negociação com a União Europeia, que poderia estar ampliando nossos mercados. Lamento o desinteresse do atual governo pelo tema, adiando mais uma vez, agora para o próximo ano, a conclusão dessas negociações. Enquanto isso, a União Europeia avança seus entendimentos com outras regiões do mundo, em especial com os Estados Unidos. Em um governo do PSDB, esse tema será tratado como prioridade.”

Embora franco,  Aécio equivoca-se. O Brasil precisa mesmo é aprofundar as relações com os BRICS, fortalecer as relações Sul-Sul e liderar o processo de integração da América do Sul, como tem feito. E pra isso nem é preciso abrir mão das relações com europeus e norte-americanos, que continuam sendo cultivadas normalmente. Num mundo multipolar como o deste século XXI, o alinhamento automático e ideológico a uma ou outra potência não faz mais qualquer sentido. Que o diga o México, que “casou-se” economicamente com os USA através do NAFTA em 1994 e vinte anos depois convive com uma profunda dependência do mercado norte-americano, o que acarreta ao país fragilidade econômica e gravíssima crise social, com mais de 51% de seus cidadãos vivendo abaixo da linha da pobreza, segundo dados oficiais.

Diferentemente de outros candidatos do passado, que dissimulavam suas propostas, Aécio tem sido franco com o eleitorado. Se vier a ganhar a eleição ninguém poderá argumentar que tratou-se de estelionato eleitoral. O tucano está dizendo com todas as letras qual o seu projeto de país. E nem é preciso tanto esforço assim para entender.

*Wagner Iglecias é doutor em Sociologia e professor da Escola de Artes, Ciências e Humanidades da USP.