Resposta aos ataques do empresário Márcio Chaer - Parte 2, via Facebook
20/02/2014
4) Durante o programa “Roda Viva” da última segunda-feira, quando fui indagado pelo apresentador Augusto Nunes sobre o artigo escrito pelo empresário e jornalista Márcio Chaer, eu disse que sentia vontade de rir. É verdade. E eu até já havia feito isso, horas antes, enquanto aguardava o voo de Brasília para São Paulo. Foi quando eu li o texto de Chaer, especialmente o trecho em que ele denunciou a “falha monstruosa” do meu livro, a mãe de todas as falhas. Segundo ele, eu teria “escondido nas últimas páginas do livro” os “extraordinários e-mails” apreendidos com o consultor Roberto Amaral que seriam, segundo ele, a “melhor parte e a única novidade que o livro traz” (muito embora, é preciso frisar, do alto de seu imenso conhecimento técnico, jurídico, policial e pericial, Márcio Chaer também tenha decretado que tais comunicações “não revelam crimes nem ilegalidades”. Fiquei espantado sobre ele chegar a tão profundas conclusões com base apenas na leitura de um livro, sem ouvir testemunhas ou considerar outras diligências, sem referir jurisprudência, sem quebrar qualquer sigilo nem realizar perícias, embora nunca devamos duvidar dos prodígios do gênio humano).
Chaer foi além, ele explicou que escondi esses e-mails não por uma razão qualquer, mas sim porque eu tinha o intuito sórdido de “atenuar as penas de Luis Roberto Demarco, Protógenes Queiroz e demais parceiros”.
Então agora eu gostaria de confessar em público, realmente eu escondi esses e-mails dos leitores. Tanto escondi que escrevi um capítulo inteiro, intitulado “As Ameaças do Grande Credor”, com nada menos que 34 páginas inteiramente dedicadas a essas comunicações (cerca de 7% de todo o livro). Que ideia maravilhosa para esconder alguma coisa. Para ocultar ainda mais, eu a Geração Editorial também tomamos a decisão de publicar o fac-símile de vários e-mails. Agora sim, pensamos conosco, tudo está bem escondido, ninguém irá perceber. Conforme está bem explicado por Chaer, também resolvi colocá-los “no fim” do livro, que todos sabem que é a parte mais pobre e desinteressante de um livro. As pessoas leem apenas o começo ou quem sabe até a metade do livro, jamais o final de um livro. A lição também vale para novelas e filmes: é por isso que as pessoas abandonam a audiência antes do final, pois ninguém quer saber que destino terá aquele personagem, se morrerá atropelado ou ganhará na Megasena. Creio que as pessoas querem saber principalmente dos letreiros do começo, e depois nada mais. Mas eu ainda não estava satisfeito. Além de esconder os e-mails, vejam só, eu também concedi diversas entrevistas em que abordei o conteúdo de tais e-mails. A revista CartaCapital, uma das principais do país, fez uma longa reportagem sobre eles, com capa da edição, e também me entrevistou. Não satisfeito, ainda concedi uma longa entrevista, convidado que fui por blogueiros e jornalistas da cidade de São Paulo, transmitida ao vivo pela internet. Ótimo, agora sim, pensei, agora cumpri integralmente a minha “falha monstruosa”.
Só mesmo levando na brincadeira essa construção mental de Chaer. Certamente ele desconhece o que vem a ser o clímax de uma narrativa. Para ele, eu deveria começar um livro pelo final. Os e-mails são tratados naquele penúltimo capítulo também por uma questão cronológica. Eles foram apreendidos pelo delegado Ricardo Saadi na segunda etapa da Operação Satiagraha. E toda a primeira fase do caso já havia sido abordada no livro. O final é uma das partes mais nobres de uma narrativa, senão a mais, daí a expressão comum do “fecho com chave de ouro”. Todo autor que se preza fica preocupado com o fecho de uma narrativa, ele precisa ser bem estruturado e coeso com o que veio antes. Se possível, ele deve surpreender o leitor.
Esse absurdo conceitual e ético de Márcio Chaer, de me acusar de esconder provas do leitor com interesses escusos e privados _provas essas que obtive à custa de muito trabalho e esforço e que foram divulgadas com grande destaque em meu livro_, é apenas e novamente parte da estratégia de desqualificação pública do autor e do livro, mas que se desmoraliza por conta própria.
5) Para colocar em dúvida o escritor e a obra, Márcio Chaer aponta uma falha na contracapa da primeira edição do livro, onde foi informado que o juiz De Sanctis foi transferido para outra vara “sem brilho e poder”. Ocorre que o texto não foi escrito por mim, mas pela editora. Tão logo foi identificado o problema por nós mesmos, ainda no mês de janeiro passado, o texto da contracapa foi imediatamente corrigido pela competente e profissional equipe da Geração Editorial para as edições futuras. De qualquer forma, o corpo do livro explica detalhadamente o que ocorreu, ou seja, que o juiz aceitou ser promovido a desembargador em SP, mas acabou na área de Previdência Social, sem ligação com crimes contra o sistema financeiro, que era a grande especialidade do juiz De Sanctis. Se Chaer tivesse agido com boa-fé, poderia ter explicado que o corpo do livro estava correto e era diferente da contracapa. Mas omitiu isso de seus leitores. A falha da contracapa já foi corrigida e atualizada, mas de modo algum representou dano a qualquer parte da narrativa contida em Operação Banqueiro. O leitor que adquiriu e leu o livro soube exatamente o que de fato aconteceu. O livro é o todo, não uma contracapa.
6) Márcio Chaer afirma que o livro “inventa” que o juiz De Sanctis foi surpreendido no dia da posse no Tribunal Regional Federal de que iria ocupar uma área ligada à Previdência Social. Para dizer que essa designação já era sabida antes, Chaer cita um link de uma reportagem do próprio “Consultor Jurídico”. Porém, o texto indicado não atribui a informação diretamente ao TRF, mas somente a cita como uma possibilidade, conforme se lê: “Deverá atuar no julgamento de processos envolvendo a Previdência Social”. Uma expectativa, não uma certeza. Mas vejamos o que diz o livro “Operação Banqueiro” sobre isso. Na página 436, está dito que De Sanctis “sofreu um baque” e ficou espantado ao saber, no dia de sua posse e pela boca do deputado Arnaldo Faria de Sá, que iria atuar na Previdência Social. E que no dia seguinte enviou um ofício ao Tribunal para protestar contra a área designada e dizer que “aparentemente, haveria algum equívoco”. Assim, o livro deixa claro aos leitores que o juiz ficou espantado e, no dia seguinte, reagiu. Se qualquer jornalista procurar o juiz ouvirá dele, certamente, a mesma história: que ele não sabia, ficou espantado e reagiu. Assim, como o livro pode ser acusado de ter “inventado” a história? Se Márcio Chaer tem dúvida sobre a surpresa do juiz, poderia tê-lo indagado. Mas daí a dizer que “inventei” é uma enorme distância. O juiz pode ter muitos bons motivos para dizer que não sabia. Como vimos, a notícia divulgada antes pelo site “Consultor Jurídico” não é nada conclusiva, mas sim apenas uma possibilidade, “deverá”. E também podemos tranquilamente considerar que o juiz não tenha lido a matéria do “Consultor Jurídico”, já que ele não é obrigado a consultar diariamente esse extraordinário site do empresário Márcio Chaer. Nesse contexto, é descabido afirmar que eu “inventei” essa parte da história. Há pouca coisa mais desrespeitosa a se dizer de um jornalista do que afirmar que ele “inventa” situações. O livro trabalha com entrevistas, fatos e documentos, não com invenções. Eu digo e afirmo, no post anterior, que Márcio Chaer inventou, dentre outras coisas, que o livro foi rejeitado por “defeitos incorrigíveis” por duas editoras e que há um empresário por trás do livro. Sobre o juiz, acabei de explicar que ele ficou espantado e reagiu por escrito ao tribunal, ou seja, sua reação por escrito tem total correlação com a surpresa por ele informada. Em contrapartida, Márcio Chaer fica moralmente obrigado a apresentar as provas de suas alegações anteriores, essas sim, autênticas invenções.
7) Márcio Chaer afirma em seu texto que o livro esconde que “Protógenes enriqueceu enquanto conduzia a Operação Satiagraha”. Como prova inequívoca dessa afirmação bombástica, Chaer novamente indica um link de seu próprio site “Consultor Jurídico”. Vamos à matéria (é preciso olhar com lupa e atenção redobrada absolutamente tudo o que Chaer afirma sobre o caso Satiagraha). Surpresa. Não há uma única linha da reportagem assinada por Ludmila Santos dizendo qualquer coisa parecida com “Protógenes enriqueceu enquanto conduzia a Operação Satiagraha”. A conclusão espalhada por Chaer é, no mínimo, uma interpretação pessoal e exclusiva dele. Ele conseguiu a proeza de distorcer uma reportagem de sua própria empresa.
A informação de que o delegado “enriqueceu enquanto conduzia a operação Satiagraha” não está em meu livro, caros leitores, porque não há qualquer comprovação disso. Nós jornalistas trabalhamos com fatos comprováveis. A reportagem do próprio “Consultor Jurídico” explica que há dúvidas sobre a origem de bens que o delegado acumulou ao longo de muitos anos, não apenas no período da Satiagraha (de 2007 a 2008). Um imóvel, por exemplo, foi declarado de sua posse desde o ano de 1993, quando ele sequer havia entrado na Polícia Federal. Outro lhe teria sido doado em 2006, por um padrinho. Portanto tudo anterior à Operação Satiagraha, que só passou a ser conduzida pelo delegado Protógenes por volta de março de 2007. Essas dúvidas sobre o patrimônio do delegado eram e são ainda meras possibilidades que aguardam comprovação. O jornalismo não pode passar da expectativa para a certeza sem meios possíveis de comprovação, sob pena de acabar escrevendo uma ficção. Já sobre certezas, eu as publiquei, e isso Chaer convenientemente omite. Na página 439, por exemplo, escrevi que o delegado mantinha a estranha prática de guardar em casa R$ 284 mil em espécie. O livro também traz inúmeras críticas e problemas da investigação conduzida por Protógenes, que o leitor do livro já viu e conferiu (há até mesmo um capítulo denominado “A Virose”, referência ao delegado, no qual o comportamento de Protógenes é duramente atacado por seus superiores na PF).
A afirmação de Chaer de que o delegado Protógenes “enriqueceu enquanto conduzia a Operação Satiagraha” obviamente não foi colocada inadvertidamente no ar, ela tem um alvo deliberado. A intenção é insinuar que a Operação Satiagraha foi paga e estruturada por adversários do banqueiro, como diz Chaer, “uma operação privada”. Digamos que no futuro fique provado que isso de fato ocorreu, que Protógenes recebeu dinheiro privado para “montar a Satiagraha”. Todos os dados disponíveis em 2014 não autorizam essa conclusão. Mas se ela vier com o tempo, que se publique essa parte da história atualizada (outra conclusão imediata seria que o delegado especializado em crimes financeiros era um completo e rematado estúpido, vejam só, pegar dinheiro de corrupção e colocar em seu próprio nome. Merece um prêmio de criatividade). Por outro lado, existem também as possibilidades de: a) tal alegação nunca chegar a ser comprovada; b) for inteiramente afastada. Se essas possibilidades vencerem, eu me indago como Márcio Chaer irá explicar sua afirmação feita em 2014 para atacar meu livro de que o delegado “enriqueceu durante a operação”? Bem, talvez nunca explique, e essa afirmação ficará pela estrada dos atentados à lógica, ao bom senso e à ética. É para evitar tais barbaridades que meu livro trabalha com fatos, não especulações. Lembremos, caros leitores, que coisas semelhantes já ocorreram nesse mesmo caso: por exemplo, o juiz e o delegado foram acusados de fazer grampos sobre autoridades do Supremo Tribunal Federal. Essa hipótese foi depois afastada por quatro investigações paralelas e independentes. Como descrevo no livro, também foi levantada sobre a juíza Márcia Cunha a suspeita de enriquecimento ilícito. Mas tudo foi devidamente investigado e arquivado por absoluta falta de provas. Por que eu e meu livro deveriam concorrer para novas barbaridades?
Nessa mesma linha de incriminar o delegado Protógenes Queiroz, Márcio Chaer afirma que eu omiti dados sobre o tratamento dispensado pela PF ao professor Hugo Chicaroni e o fato de fotografias das primeiras cédulas dadas pelo suborno não terem sido fotografadas. Chaer afirma categoricamente que Chicaroni “foi um ator introduzido na cena pelo delegado e não por Dantas”. Que fantástica ideia do delegado Protógenes. Pena que Chaer tenha escondido: que um dos homens fortes do banqueiro Daniel Dantas, Humberto Braz, também participou das negociações com os delegados da Polícia Federal, tudo devidamente gravado; que a Polícia apreendeu e fotografou dinheiro na casa de Chicaroni; que Chicaroni declarou à polícia, na presença de seu advogado, que procurou o delegado Protógenes a mando de gente ligada ao grupo Opportunity; que declarou que o dinheiro foi entregue em sua casa por gente do Opportunity; que Chicaroni foi condenado pelo juiz Fausto De Sanctis por corrupção ativa; que depois Chicaroni voltou atrás e disse que o dinheiro em sua casa não era ligado a Dantas. Apresento aos leitores toda essa cadeia de eventos e atos, e Chaer diz que tudo isso não passa de “um ator introduzido na cena pelo delegado”. Sua estratégia é minimizar atos e fatos e levantar suspeitas _que belo exemplo de jornalismo.
8) Em outro trecho de seu texto, Márcio Chaer afirma que o meu livro não abordou “maletas de grampo clandestino” que teriam sido usadas para interceptar conversas de ministros do Supremo, segundo alegou um delegado da Polícia Federal do Rio. A verdade é que meu livro examina criteriosamente, ao longo de muitas páginas, a existência ou não dos supostos grampos telefônicos sobre autoridades do STF a mando do comando da Satiagraha. Digo que todas as investigações oficiais abertas acabaram dando em nada. Explico que o então ministro da Defesa Nelson Jobim deu uma informação inexata ao presidente Lula, e isso custou o cargo do delegado Paulo Lacerda na direção da Abin. Sobre tudo isso, Chaer passa impávido, como se eu nada tivesse escrito ou abordado, como se eu tivesse fechado os olhos para a suposta, e põe suposta nisso, “grampolândia” no Supremo. Mas agora sim, segundo ele, agora tudo será esclarecido com o depoimento inequívoco desse delegado _que, aliás, nunca trabalhou na Operação Satiagraha.
Mas a verdade é que a alegação do delegado também jamais ficou comprovada. Novamente: eu não trabalho com especulações, mas com fatos. No recente livro de grande sucesso “Assassinato de Reputação”, o próprio ex-secretário nacional de Justiça Romeu Tuma Júnior informa que a alegação do delegado foi investigada, mas a Polícia Federal a descartou _muito embora Tuma Jr reclame da qualidade da investigação. Quando Tuma Jr. recentemente compareceu ao programa “Roda Viva”, os espectadores ouvimos do experiente e competente jornalista da “Folha de S. Paulo” Mario Cesar Carvalho, um dos principais nomes do jornalismo brasileiro, que ele, jornalista, seguiu a incrível trilha aberta pelo delegado do Rio mas nada comprovou, uma pessoa-chave desmentiu ou recuou. Zero novamente. Portanto, a resposta está aqui: a polícia investigou, um grande jornal investigou, mas nada se encontrou, as pistas não deram em nada. Apresento aos leitores e a Chaer o fato de que não uma, mas quatro investigações remexeram a questão do grampo sobre o Supremo (a saber: a CPI dos Grampos, o inquérito do delegado Amaro, o inquérito da PF de Brasília e uma sindicância da Abin) e nada encontraram, nem um grampo telefônico ilegal foi localizado. Em resposta a isso, Chaer cita a fala de um delegado que também já foi investigada e descartada.
Haveria ainda uma porção de reparos a fazer no texto de Chaer _como a parte em que ele afirma que o juiz De Sanctis teve “a iniciativa de quebrar o sigilo telefônico de todos os brasileiros”, mais uma declaração hilária de Chaer, que não vem acompanhada da informação de que essa alegação foi devidamente investigada e arquivada. Mas não quero cansar mais o leitor. Por fim, gostaria de frisar que fiz esses esclarecimentos em respeito ao leitor, que merece ouvir minhas explicações.
Em tempo: após o texto que aqui postei na última terça-feira, em que apontei a mentira contida no primeiro parágrafo de seu texto, Chaer apressou-se em corrigir a mentira, alterando o texto. Poderia aproveitar o embalo e corrigir todas as outras também. Obrigado, Rubens Valente.