"O valor do Fora do Eixo vem da imagem que ele produz cultura"

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Finalmente um texto crítico sem descambar no 'trabalho escravo', 'seita', 'lugares culturais militarizados" ou a barbárie de 'fora do beiço".

Não corrigi os erros, obviamente a pesquisadora não tem português como primeira língua, mas seu texto é perfeitamente inteligível.

Olhar de Alguém de Fora no Fora do Eixo

Por Shannon Garland, em seu blog

O que eu posso dizer com respeito ao Fora do Eixo que ainda não foi dito? Pra quem não me conhece, eu sou doutoranda na etnomusicologia na Columbia University, pesquisando questões da relação entre música independente, novos modos de economia de cultura e tecnologias digitais. Minha pesquisa vai além do contexto Brasileiro e o Fora do Eixo no Brasil, mas faz parte. Eu colaborei na Casa FdE em São Paulo a partir do fim de Julho 2011, até Abril (mas ou menos) de 2012. Não morei lá, mas fui duas vezes por semana por uns meses e continuei a trabalhar à distância depois, além de assistir o Congresso FdE em 2011, o Seminário da Música em 2012, o Grito Rock em várias cidades, e outros.

Sendo uma pessoa que nunca foi engajada com Fora do Eixo como membro próprio, nem parceiro com projeto particular a realizar com eles fora da minha própria pesquisa, talvez eu tenha uma perspectiva diferente a várias que tão rolando por ai. Aliás, nas críticas das críticas do Fora do Eixo, tem muita pessoa pedindo que algum jornalista vá pra lá pra observar e sacar as próprias conclusões, algo que seria mais “objetivo,” embora, como o próprio Capilé afirma, isso não exista. Nisso eu tou com ele sim, acho que temos que assumir as nossas posições, é através delas que a política se faz. Até agora eu só vi pessoas que ainda trabalham com eles, tipo Torturra, Ivana Bentes, defendendo, e do outro lado ex membros e pessoas que se ferraram com eles alegando.

Como eu nem tou “com” eles nem fui pessoalmente ferida, acho que posso oferecer algo mais perto a esse “objetivismo” tanto pedido. Isso também é porque, sem trabalhar com/para/como eles mesmo, seria impossível saber o que está de fato rolando. Eu também fiquei fora dos processos mais por dentro da rede; achar que um jornalista ou qualquer um possa chegar lá, observar, até passar umas semanas e sair conhecendo como funciona “de verdade” é um erro muito grande. Como foi dito no depoimento da Laís, só certas pessoas tem acesso aos processos e às decisões de funcionamento maior. Nem eu, que trabalhei por meses lá, sei direto, e acho que como falou Laís, é assim mesmo com a maioria das pessoas de baixo nível que trabalham lá. Ao mesmo tempo, os trabalhos que fiz pela rede e as interações que vi sim me deram uma vitrine ao funcionamento de modo mas profundo do que seria chegar lá e ser recebido por alguém que te explica nessa linguagem tão especial as maravilhas do Fora do Eixo.

Eu fui trabalhar pelo Fora do Eixo pra poder conhecer por mim mesma. Meu interesse pessoal e professional é arte, tecnologia e economia, e eu queria sacar minhas próprias conclusões sobre o que o Fora do Eixo estava fazendo com tudo isso. Como acho que o pessoal de Fora do Eixo sabia, eu também conheço muitas pessoas do meio de produção de música independente em São Paulo, pessoas que realmente não gostam nada do Fora do Eixo. Muitas destas pessoas conhecem FdE muito de perto, já que quando Cubo e Calango ainda existiam, lá quando o Fora do Eixo estava começando e os festivais da Abrafin realmente estavam no auge, eles trabalharam juntos no meio geral de produção de música. Muitas destas pessoas vêm trabalhando nesse meio também por uma década, ou em alguns casos, por mais tempo. Então não é um bando de folgados não fazendo nada e meio ressentidos que levantam críticas. São pessoas que tão realmente tentando produzir arte, fazê-la de forma sustentável, lidando também com os desafíos e aberturas que as tecnologias digitais proporcionam. E, vale ressaltar, elas também querem ver um fim aos absurdos quanto à cultura, política, crítica (ou falta disso) sob o controle dos conglomerados gigantes de telecomunicação.

Isso é uma das minhas críticas ao Fora do Eixo: quase qualquer pessoa que questiona é sim chamada de “analógica” e tratada como se não quisesse mudança de cultura, de política e tudo mais. Que tá vivendo no passado e que não quer trabalhar pra lidar com as mudanças aceleradas pelas novas tecnologias e o modo atual do capitalismo (ouvi muito, mas muito esse tipo de discurso no Congresso, no Seminário de Música, etc.). Por outra parte, eu também não posso deixar de criticar alguns dos críticos por tomar um posicionamento de crítica sem conhecer o Fora do Eixo muito bem. Os dois lados viram turminhas fechadas de alguma forma, repetindo fofocas e “verdades” repassadas já por anos. Eu não culpo muito nenhum dos lados nesse sentido. Somos seres sociais e fazemos nossos grupos em parte contra outros grupos, que nem os Liliputianos. Contudo, eu também entendo o cansaço dos críticos, porque as críticas não são de fato tomadas em sério pelo Fora do Eixo, a não ser que abram um caminho pelo avançao do Fora do Eixo que não foi pensado até então. Nos casos de autocrítica que o Fora do Eixo faz (e ele faz sim), parece que houveram umas mudanças—todo o processo de desenvolver a produção de múisca em várias etapas mostra isso, acho. Só que ao mesmo tempo foram feitas pra poder fortalecer a rede (e vou volver a isso depois, e falo nos artigos). Logo antes de eu deixar de pesquisar a rede o FdE estava tentando descentralizar as operações de música e melhorar o feedback entre bandas e produtores. Só que, de novo, acho que tem uma brecha entre esse discurso e até vontada mesma e o que acaba sendo praticado. (continue lendo aqui)