Gustavo Anitelli e suas experiências com o Fora do Eixo

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Gustavo Anitelli

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10/08/2013

Pessoal, fiquei off estes dias todos e hj passei minha time line lendo uma série de denuncias e defesas da rede Fora do Eixo. Tenho amigos e colegas de ambos os lados e quero fazer uma contribuição sincera para esquerda e para o Fora do Eixo.

Conheci a organização a cerca de 5 anos atrás, na época em que eles atuavam exclusivamente na música, momento que nós do Teatro Mágico iniciávamos o movimento Música Pra Baixar. Tive um impacto grande com a organização da moçada, acordos e possibilidades de parcerias, mas as desavenças surgiram, o que é natural em qualquer lugar, o que as vezes me incomodava era o clima de guerra, faltava cultura política na minha opinião.

A partir de um certo momento me cansei do cenário político, a luta pela música livre foi ganha, não por nós mas pelo próprio mercado, passou a ser burrice para qualquer artista não liberar seu conteúdo na rede. Também me vi organizando palco para uma séria de bandas iniciantes apresentarem suas canções, vezes reproduzindo discursos do censo comum que reforçavam uma sociedade injusta e desigual, isso me desanimou, não queria gastar minha energia militante desta forma, o Fora do Eixo era de fato mais competente que nós para lidar com isso. Mergulhei numa profunda reflexão sobre minha atuação, o partido, o governo, me distanciei de alguns espaços de atuação política também por conta de meu mestrado e o cuidado com meu falecido irmão. Nesse meio tempo vi o Fora do Eixo crescer muito, crescer , crescer , crescer......acho que as críticas apontadas esta semana tem muito a ver com este fenômeno, quando eram somente uma iniciativa isolada, não detinham tanta importância para tantas criticas, mas quando se colocam de alguma forma como uma alternativa para o atual momento, daí surgem as cobranças, expectativa é a mãe do vai dar merda.

Eu nunca entendi muito bem a posição deles, me pareciam pragmáticos demais a uma certa altura, vi o Capilé em seu twitter pessoal a 3 anos atrás declarar voto na Dilma e no deputado federal do PSDB na época Mauro Mendes(um dos políticos mais ricos do país) , isso me deixou intrigado, mas a vinda deles a São Paulo mudou a atuação do grupo, que passou a assumir pautas mais políticas e uma aproximação forte com a campanha do Haddad, tendo importância na indicação do secretario da cultura e até mesmo de Rodrigo Savazoni (chefe de gabinete do Juca), que fez mestrado comigo na UFABC.

Até aí não vejo nenhum problema de ordem ética, é uma força política disputando espaço. No entanto, acredito que as críticas levantadas sejam relevantes para o crescimento da rede e também para a transparência destes gestores que se colocam claramente a favor do movimento. A postura da não aceitação dos apontamentos levantados revelam um problema de 2 ordens ; a) se recebem recursos públicos por serem uma rede, por trabalhar com a economia solidária, as pessoas tem o direito sim de saber se este investimento do estado esta sendo revertido para sua finalidade, a juventude sai as ruas por mais transparência no estado, na mídia, é natural cobrar o movimento, b) não são princípios de transformadores sociais a marginalização daqueles que defendem um outro ponto de vista. Chamar as pessoas de elite, rancorosas, invejosas, é só uma prova de que não aceitam qualquer forma de questionamento, e disso eu tenho muito medo.

As pessoas saem as ruas em julho também cansadas da velha política dos gabinetes, dos acordos as escuras, da falta de transparência, e portanto é de direito cobrar publicamente uma organização que se utiliza do discurso do novo, mas que para tanto não pode possuir a velha forma de se fazer política. A pauta institucionalizada do Fora do Eixo, dialogando com uma série de políticos de variados partidos causa desconfiança nas pessoas que já são descrentes destes velhos modelos, o que parece ser uma organização não partidária, torna se um grupo de todos os partidos, na medida em que estes possam trazer benefícios e recursos para a realização de suas atividades. Se até a Globo e os demais partidos são rechaçados pela falta de transparência, não é uma organização política com cara nova que vai ter o privilégio de passar desapercebida.

Percebo também que quem esta se colocando não é a Veja e o Capital que estão sendo desestruturados pela maneira anticapitalista, mas sim pessoas que já trabalharam com o pessoal, artistas, produtores, militantes, feministas, mulheres, gente de bem.

De qualquer modo, coloco aqui alguns questionamentos para que possamos refletir, e sem dúvida superar estas duvidas de modo que a rede continue. Afirmo que o Fora do Eixo também é importante para o desenvolvimento da cultura no país, tenho amigos lá dentro e nós enquanto Teatro Mágico já realizamos apresentações em parceria com coletivos provenientes do Fora do Eixo ( eventos nossos que convidamos o pessoal para contribuir na produção e receber financeiramente por isso).

Acho que transparência tem q ser o foco agora da rede, Capilé no Roda Viva relata alguns dados que sabemos que não são a realidade , quando afirma que vários artistas surgiram do Fora do Eixo como Criollo, Emicida ou GAby Amarantos. Ainda não conheço nenhum artista que tenha surgido a partir da rede do Fora do Eixo e consiga sobreviver para além desta. Esta falta de transparência serve para convencer gestores do investimento na rede como forma de desenvolver o mercado da música no Brasil, o que de fato não acontece.

Também é fato que muitos dos recursos são provenientes sim do financiamento do estado e de agencias internacionais e nisso não existe nenhum problema, mas é interessante que isso seja dito, senão da margem para as pessoas se sentirem enganadas.

Acho ainda que os espaços onde a rede se estabeleceu tem de possuir uma abertura na participação de outros agentes, para que não se monopolize uma visão de cultura ou não de margem para o contra ataque e assim crie esta cisão que parece existir hj de quem é pró e quem é contra o Fora do Eixo. A prefeitura de São Paulo é um exemplo, acredito que na próxima Virada Cultural, a curadoria tem que ser discutida publicamente, assim não precisa existir uma hegemonia do grupo Fde na escolha dos artistas para o evento mais importante da cidade.

Por fim, gostaria de fazer um apontamento pessoal de visão do mundo não só para os colegas do Fora do Eixo, mas para todos aqueles que acreditam numa atuação descompromissada com as pautas velhas e antigas da esquerda.

Se por um lado, os partidos se tornaram velhos e engessados, com sua direção já estabelecida nos sindicatos, prefeituras e demais entidades publicas, também não sou grande entusiasta das novas formas de fazer política, desprovidas de uma visão geral de mundo. Para mim, não vale de nada a música livre, a internet livre ou mais verbas para cultura se continuarmos reproduzindo os valores de uma sociedade injusta, desigual e violenta. Não consigo entender a falta de compromisso de alguns ao se depararem com casos de violência contra a mulher, assedio moral entre outros. São elementos que jamais irei admitir e entendo que exista em todas as organizações, só não entendo a falta de combate das lideranças frente a estes casos. Num momento aonde os partidos de esquerda não são suficientes para dar respostas claras sobre as transformações do mundo, tão pouco a política do diálogo amplo, com qualquer partido, sem um compromisso geral seja uma alternativa . Nessa confusão de caminhos, as pessoas precisam assumir lado, e o meu é de uma sociedade igualitária, anti patriarcal, anti homofóbica , anti racista, anti capitalista.

Tenho muito rancor no meu coração porque as injustiças me deixam indignado, para tanto é o momento sim de assumirmos nossa posição no mundo, sermos companheiros das outras lutas que tentam salvar a juventude negra e periférica, as mulheres e os demais setores marginalizados e violentados nessa sociedade desigual e tão naturalmente aceita que é o Brasil. abraços