________________ PublicidadeOpinião: Posturas de Serra e Russomano indicam que cenário obscurantista de 2010 pode se repetir
Por Marcelo Hailer*, Expresso SP
24/08/2012 Setores conservadores podem trazer às eleições municipais o espectro de temas religiosos e pretensamente morais, como aconteceu há dois anos nas eleições presidenciais
Questionado pelo jornal Folha de S. Paulo a respeito de qual estratégia utilizaria para diminuir a violência na capital paulistana, Celso Russomano, candidato pelo PRB, declarou que o caminho para diminuir a violência é a “igreja”. “Quero o apoio de todas as igrejas, elas são importantes para a sociedade. As pessoas que não matam e não roubam é porque têm uma linha religiosa. A religião ajuda, vou preservar todas as igrejas e gostaria que em cada esquina tivesse uma igreja. É uma linha de conduta para a sociedade”, declarou Russomano ao jornal, provavelmente esquecendo o fato de o Brasil ser um Estado laico.
E a declaração do candidato possui mais um agravante, ao afirmar que as pessoas munidas de fé religiosa “não matam e não roubam”, logo, para o candidato, os ateus são um bando de assassinos e ladrões. Segundo agravante nesta declaração é quando Russomano afirma a igreja ser “uma linha de conduta para a sociedade”. Pasmem! Estamos a um passo de ter uma cidade teocrática, onde as práticas dos sujeitos paulistanos devem ser pautadas por religiões? E a liberdade do pensar, onde fica? Mas tal posição não surpreende, visto que Russomano, ao saber que Serra cortejava a igreja Renascer – aquele da bispa Sônia e Estevam, que foram presos com dólares não declarados dentro de uma bíblia –, foi logo “roubar” o apoio desta. Vale lembrar também que o seu partido é braço político da Universal do Reino de Deus e parte da Assembleia de Deus também está com Russomano, assim como outra parte está com Serra…
No ultimo dia 9 de agosto, o candidato do PSDB, José Serra, acompanhado do prefeito Gilberto Kassab (PSD-SP), esteve presente em um culto da Igreja Mundial, ministrado pelo pastor Valdemiro Santiago, que chegou a abençoar o candidato. E como não se bastasse, na ultima sexta (17), o candidato tucano fez duras críticas ao chamado “kit gay”, nome pejorativo dado por setores conservadores ao Escola Sem Homofobia, projeto criado pelo Ministério da Educação durante a gestão de Fernando Haddad, candidato à prefeitura paulistana pelo PT. Em entrevista à Agência Estado, Serra declarou que o “kit gay tinha aspectos ridículos e impróprios para passar às crianças”.
O candidato tucano esqueceu um único detalhe: o material pedagógico de combate à homofobia no âmbito escolar era destinado à 5ª série em diante, logo, para alunos com mais de 13 anos, não mais crianças e sim adolescentes. Mas a fala de Serra já revela que o mesmo está alinhado ao ideário reacionário no que diz respeito a se propor um material pedagógico progressista com vistas a combater o bullying homofóbico que tem vitimado alunos tanto em São Paulo como no resto do Brasil. Mas o tucano não parou por aí, ao declarar que não pretende abordar a questão do combate à homofobia em sua campanha, disse que Haddad ainda deve “explicações” a respeito do material. Explicação a quem, cara pálida? Aos setores obscurantistas que fizeram campanha nacional contra o material e alegaram que o então ministro da Educação iria “induzir as crianças ao homossexualismo”?
“A cidade de São Paulo não vai aceitar o ódio”
Na ultima quarta-feira (15) o pastor Silas Malafaia, opositor declarado aos direitos civis LGBT, declarou que a “comunidade evangélica, os líderes não vão dar refresco para Haddad, vamos cair em cima dele”, isso por conta do material do Escola Sem Homofobia. Vale lembrar que em 2010 Malafaia apoiou José Serra e, em 2006, liderou um movimento nacional contra o PLC 122/2006, projeto que visa criminalizar a homofobia em todo o Brasil. Na ocasião, Malafaia declarou que a homossexualidade “é a porta de entrada para a pedofilia”.
Portanto, temos aqui o campo político e ideológico da eleição paulistana definido: em torno de Celso Russomano e José Serra ronda o espectro dos setores fundamentalistas que elegeram a candidatura de Haddad como inimiga. E qual tem sido a postura de Fernando Haddad frente a estes ataques que enterram o Estado Laico e pouco se importam com o status de violência que tem sido a vida de muitos jovens homossexuais?
O primeiro passo dado pelo candidato se deu em maio, quando participou de um evento organizado pelo Diretório Municipal do PT sob a temática de políticas públicas para LGBT e defendeu a liberdade das sexualidades, o combate à homofobia e reafirmou que tal perseguição ao tema da diversidade faz parte da agenda de um pequeno grupo obscurantista. Na semana passada, Fernando Haddad lançou o seu programa de governo e dentro é possível ler um capítulo inteiro voltado para a questão da diversidade sexual, que foi dividido em nove tópicos. No ato do lançamento, o candidato defendeu o direito ao afeto nos espaços públicos aos homoafetivos.
E nesta semana Haddad falou sobre a separação entre Estado e crença religiosa, conceito mais conhecido como Estado Laico, quando declarou à imprensa que não iria pedir votos em cultos religiosos, pois, na visão do candidato, tal atitude “não é compatível” com a postura de um político candidato. Posteriormente, o candidato petista foi interpelado se daria explicações sobre os rumos do Escola Sem Homofobia e de como lidaria com esta questão na campanha, e respondeu que “a cidade de São Paulo não vai aceitar de jeito nenhum que o ódio seja fomentado na nossa cidade, seja contra o que for, contra o negro, a mulher, a comunidade LGBT. A cidade não aceita violência. Aquele que quiser promover a violência e a divisão da sociedade vai se arrepender. A sociedade, em 2010, já recusou esse tipo de abordagem. Fará de novo em 2012?, disse Haddad.
Espanta notar que as duas declarações do candidato petista foram comemoradas e classificadas como “modernas”, quando na verdade tal postura deveria fazer parte do cotidiano dos políticos e candidatos, seja a cargos legislativos ou majoritários. O eleitor paulistano deveria é se espantar e se chocar quando dois candidatos vão ao ataque contra um projeto que visa diminuir a discriminação que alunos LGBT sofrem cotidianamente. O eleitor também deveria se espantar, pois, que as criticas feitas ao material Escola Sem Homofobia não pressupõe uma outra política para combater o ódio ao diferente dentro da sala de aula e na cidade como um todo, o que se tenta é desqualificar um candidato por defender a diversidade cultural e sexual da cidade de São Paulo. Haddad apontou para um Estado Laico, em tempos onde parlamentares usam da bíblia e da “fé” para atacar setores “minoritários” da sociedade, isso não é pouca coisa.
Hanna Arendt acreditava que a educação era o ponto de salvação das crianças e também o ponto de renovação da sociedade, portanto, encerremos com as palavras de filósofa: “A educação é o ponto em que decidimos se amamos o nosso mundo o bastante para assumirmos a responsabilidade por ele e, com tal gesto, salvá-lo da ruína que seria inevitável não fosse a renovação e vinda dos novos e dos jovens. A educação é, também, onde decidimos se amamos nossas crianças o bastante para não expulsá-las de nosso mundo e abandoná-las a seus próprios recursos, e tampouco arrancar de suas mãos a oportunidade de empreender alguma coisa nova e imprevista para nós”.
*Jornalista e mestrando em Comunicação e Semiótica pela PUC-SP
Marcelo Hailer: Posturas de Serra e Russomano indicam que cenário obscurantista de 2010 pode se repetir
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