A grafia do artigo traduzido está no português de Portugal e a dica do link mais uma vez foi do Antônio Luiz Costa.
Leia também os comentários de Vila Vudu sobre o jornalismo reacionário que alimenta mentes fascistas como a desse terrorista nórdico e especialmente o apanhado que Pepe Escobar faz de como políticos e mídia européias contribuem para formar e acirrar a loucura de fascistas como Anders Breivik.
Seria muito interessante que os conservadores que odeiam a democracia, os direitos humanos e defendem seu ódio como 'liberdade de expressão' dessem uma boa lida nas mais de 1500 páginas de pura bobagem odiosa escrita pelo terrorista nórdico. Talvez aprendam que os preconceitos de classe, ou os de origem regional, o sexismo exacerbado, os estereótipos contra árabes/mulçumanos e a homofobia que eles adoram lançar luz podem gerar a morte de seus iguais.
NORUEGA: Anders Breivik - sem entidade e sem causa
Por Boris Johnson, no THE DAILY TELEGRAPH LONDRES
25/07/2011
Podemos ignorar a sua ideologia pueril. Anders Breivik só estava interessado em si próprio, escreve Boris Johnson.
Não basta dizer que ele é louco. Anders Breivik é evidentemente louco: ninguém no seu juízo perfeito teria feito o que ele fez. Também não basta dizer que ele é o demónio. Se a palavra demónio tem algum significado, então, é óbvio que se aplica a um homem que vai a uma ilha de um lago onde há um campo de férias, pede aos jovens que aí estão que corram na sua direção e mata 85 com uma espingarda automática.
Nunca ficaremos satisfeitos com palavras simples como “louco” ou “demónio”, e nos dias e semanas que aí vêm podemos esperar imensas psicanálises sobre este triste e arrogante psicopata de 32 anos. Vamos convocar e entrevistar todos os diabos da sua mente. Com a ajuda dos investigadores noruegueses, vamos tentar perceber como é que esses demónios o convenceram a agir de forma tão premeditadamente cruel; e como guia vamos usar o manifesto de mil e quinhentas páginas de ódio que ele (e possivelmente os seus cúmplices) pôs na internet.
É, em muitos aspetos, um documento absurdo, com um plano para fazer ressuscitar a antiga ordem dos Cavaleiros Templários, com Breivik como “Cavaleiro Justiceiro”. A ideia era mobilizar um exército de loucos como ele para libertar a Europa de imigrantes até 2083. Nessa data, passarão 200 anos sobre a morte de Karl Marx, a quem Breivik culpa pelo igualitarismo, o feminismo, o multiculturalismo e por mais uma data de coisas que ele detesta. A tentativa de Mein Kampf de Breivik está pejada de reflexões de adolescente, a partir da Wikipedia, sobre Gramsci, Adorno e o Islão, e confesso que não li tudo até ao fim.
Mas li o suficiente para perceber a essência – e há qualquer coisa de curioso e preocupante nas suas obsessões. Está sempre a falar da EUSSR e na “Eurabia”. Ataca o multiculturalismo como a “grande mentira”, e afirma que “agora, o politicamente correto paira sobre a sociedade da Europa ocidental como um colosso”. “A União Europeia pode ser reformada?”, pergunta ele. “Duvido. A UE está arquitetada por uma classe de burocratas que se serve a si própria, que quer alargar os seus orçamentos e poder, apesar dos danos que causam.” Afirma que a Europa tem sido sistematicamente traída pela imigração em massa de países muçulmanos e que o método desta imigração tem sido ocultado ao eleitorado. Cita vários dos mais importantes comentadores britânicos em apoio das suas próprias opiniões. De facto, é fascinante ver como está enraizado neste extremista norueguês o discurso político da angloesfera.
Meus amigos, não há uma maneira suave para dizer isto: muito do que este demónio louco diz pode ser tirado dos comentários e dos blogues que encontramos nos media, especialmente nos media “conservadores”, da Grã-Bretanha. (grifos do Maria Frô) Há quem leia as suas tristes declarações e conclua que foram as suas ideias inflamadas que o guiaram. Dirão que os seus atos bárbaros foram estimulados pela fúria contra a EUSSR e a imigração, tal como as mortes do 11 de setembro foram provocadas pelos dogmas do extremismo islâmico.
A verdade é que ele tem muito em comum com os bombistas suicidas islâmicos. Sente-se incomodado pela emancipação feminina e pensa que as mulheres estão melhor em casa. Parece detestar a homossexualidade. E, acima de tudo – e nisto, assemelha-se muito a um muçulmano – acredita que os seus próprios líderes religiosos são profundamente decadentes e se desviaram da ortodoxia. Repele, como muitos dos terroristas muçulmanos, tudo o que se pareça com uma mistura de culturas.
Dirão que estamos, de facto, a olhar para uma imagem no espelho de um terrorista islâmico – um homem guiado por uma idêntica mas oposta ideologia maníaca. Há aqui, sem dúvida, uma simetria e, em ambos os casos, tanto no de Breivik como no do bombista muçulmano, não creio que a ideologia seja verdadeiramente o cerne da questão. Ontem, as televisões encontraram alguém, da Noruega, que o conhecia, um homem chamado Ulav Andersson, que diz ter conhecido Breivik muito bem. Mostrou-se surpreendido com a história dos Cavaleiros Templários, porque nunca soube que Breivik fosse religioso e também nunca lhe pareceu que se interessava por política.
“Não parecia sequer ter opiniões”, disse. “Tornou-se irritável quando uma rapariga de quem ele gostava o trocou por um homem de origem paquistanesa”, conta Ulav Andersson.
Não tem nada a ver com imigração, ou Eurabia, ou com o Hadith, ou com a conspiração dos eurocratas contra o povo. Não tem nada a ver com ideologia ou religião. Tem tudo a ver com ele e com o seu sentimento de inadequação em relação ao sexo feminino. O mesmo se pode dizer (e tem sido dito) sobre muitos dos jovens terroristas muçulmanos. A razão fundamental para um comportamento tão insensível está profundamente enraizada no seu próprio sentimento de rejeição e alienação. É a ideologia que lhes dá a causa ostensiva, que lhes potencia o veneno no sangue, que lhes dá a desculpa para dramatizarem o ressentimento que sentem de forma poderosa e para matarem.
No entanto, no caso de Anders Breivik há uma importante lição a tirar. Ele matou em nome do Cristianismo e, evidentemente, não culpamos os cristãos ou a “Cristandade”. Pelos mesmos padrões, não devíamos culpar o “Islão” por todos os atos de terror pelos jovens muçulmanos. Há jovens patéticos que têm um tal sentimento de impotência e rejeição que decidem vingar-se horrivelmente contra o mundo. Há pessoas que se sentem tão fracas que precisam de matar para se sentirem fortes. Não precisam de uma ideologia para agirem como agem.
Michael Ryan não tinha ideologia, em Hungerford; Thomas Hamilton não tinha ideologia em Dunblane. Tentar avançar qualquer outra explicação para os seus atos – avançar complicados fatores “sociais” ou examinar o impacto do multiculturalismo na Escandinávia – é simplesmente entrar no jogo que para eles é muito importante.
Anders Breivik pode ter criado um impressionante manifesto de mil e quinhentas páginas mas, como muitos outros do seu género, é essencialmente um narcisista e um egocêntrico que não consegue lidar com a rejeição. Devíamos gastar menos tempo a pensar nele e mais a pensar nas vítimas e nas suas famílias.