Maurício Caleiro: Cai na real, blogosfera!

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Primavera digital chega ao fim Por: Maurício Caleiro, em seu blog 23/02/2011

O debate político brasileiro vive um momento tenso e contraditório. Embora seja inegável o salto qualitativo propiciado por uma maior penetração de blogs não-corporativos nos dois ou três últimos anos, certos vícios que caracterizaram a atuação de setores da blogosfera no período cobram, enfim, o custo de sua incongruência.

Pertence à lógica mais elementar, inescapável, a conclusão de que se o governo Dilma impinge ao país, neste momento, um duríssimo choque anticíclico - como não se viu igual sequer no turbulento início da presidência de Lula, herdeiro da “herança maldita” tucana – o faz porque há um grave problema com as contas deixadas pelo ex-presidente. Negar a evidência de um pronunciado déficit equivale a incorrer em desonestidade intelectual em nome de interesses político-ideológicos[1].

E distorcer os fatos em nome de tal modalidade de interesses é precisamente a acusação que, de forma muito justa, é recorrentemente feita contra a mídia corporativa. Portanto, os blogueiros que apoiam incondicionalmente o governo, não importando quão grave sejam as medidas que este toma, não estão se apercebendo do risco de se igualarem ao “Pig” que tanto criticam.

Dicotomias burras De minha parte, estou cheio dessas divisões absolutistas e maniqueístas entre nós (os puros) e eles (os corruptos), PT x PSDB, blogosfera independente x mídia corporativa, Lula x FHC, Brasil x EUA. Que me desculpem os fanáticos, mas o mundo não é em preto e branco.

Também me encheu o simplismo fácil com que se usa o termo multiuso PIG (Partido da Mídia Golpista) como explicação para todos os males que nos afligem, como se uma atividade complexa e que envolve milhares de profissionais pudesse ser sempre, inapelavelmente, em qualquer contexto, associada a um rótulo jocoso que não poucas vezes tem servido de bode expiatório e de desculpa para que a esquerda deixe de olhar para seu próprio umbigo e reconhecer seus erros e contradições.

E, por fim, embora considere Lula, disparado, o melhor presidente que o país já teve, não estou disposto a consentir com seu processo de canonização e mitificação, em pleno andamento, e que o presume um ser perfeito, imune a imperfeições ou erros e isento de responsabilidades, com uma manada feroz atacando, a la Inquisição Espanhola, quem ousa fazer qualquer restrição ou crítica. Ora, uma das grandezas maiores de Lula, tanto no espectro político quanto humano, é precisamente ter aprendido com seus erros e derrotas e a partir deles se aprimorado para se tornar o excelente presidente que foi e o notável ser humano que é. Santificar Lula, na verdade, o diminui, ao invés de engrandecê-lo.

Cai na real, blogosfera Não bastasse essa crise ética que se manifesta em setores da blogosfera e os torna similar, em dissimulações interesseiras, à mídia corporativa que tanto critica, Dilma Rousseff, após ter dispensado, por conta do episódio da licença Creative Commons no MinC, um tratamento no mínimo desrespeitoso aos ativistas digitais que tanto a apoiaram, presta-se ao lamentável papel de voar de Brasília para São Paulo para prestigiar, ao lado de toda a fauna tucana, os 90 anos da publicação que mais decaiu eticamente no Brasil na última década, a ponto de dar voz a um aloprado que “denunciou” Lula como estuprador e de estampar ficha policial falsa da pré-candidata Dilma na capa. E o fez sem um mísero pedido de desculpas em troca.

Ante a reação indignada de setores da blogosfera contra esse autêntico tapa na cara dos que, gratuita e dedicadamente, tanto lutaram pela candidatura Dilma e contra a mídia corporativa que a Folha representa, a reação foi um histérico cala-a-boca, seguido de tentativas grosseiras de desqualificação do interlocutor. Mal posso acreditar que depois de todos os escândalos e absurdos de um jornal que denunciei implacavelmente, vivi para ver alguns petistas igualarem-se a Marcelo Tas e elogiar a Folha por gozar as próprias mancadas. Foi um espetáculo doloroso.

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