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Yakov Fidélis*
Graduado em Direito e atualmente graduando-se na FFLCH
Nos recentes acontecimentos da Universidade de São Paulo em geral e da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas em específico, não me surpreendi com a reação discriminatória e hipócrita de muitos que, na contramão do desenvolvimento humano e histórico, aplaudem a criminalização das drogas. O moralismo social é um dado que conheço bem. Entretanto, fiquei impressionado com a reverência e a defesa geral que as pessoas fizeram em favor das leis e instituições no Brasil. E surpreso com a reação de amplos setores da comunidade universitária sobre todo esse assunto.
É muito fácil ouvir na rua e em fóruns na Internet o lugar-comum que diz algo como “no Brasil, as leis não funcionam, e quando funcionam, são injustas”. Falar mal de políticos, ou seja, de quem cria e executa as leis, é praticamente um atestado de cidadania brasileira. Judiciário, saúde, educação, segurança, urbanismo... não há nada que se elogie no Brasil; até mesmo o futebol, que junto com o Carnaval compõe tradicionalmente as únicas coisas que prestam por aqui, está em baixa. Em suma, é tudo muito ruim por aqui quando o assunto são leis e instituições. Contudo, de repente, durante esses acontecimentos na USP, pareceu que as leis e instituições no Brasil viajaram séculos no futuro, e se transformaram nas próprias representações absolutas da Justiça, da Democracia. Todas as desconfianças e críticas que comumente ouvimos e dizemos por aí, subitamente desapareceram para dar lugar a juízos como “a lei é para todos”, “os policiais estavam apenas cumprindo a lei”, “a polícia está lá para garantir a segurança de todos”. De repente, todo mundo virou legalista. A própria mídia tradicional, que constantemente divulga os absurdos e abusos do Estado, não levantou uma suspeita sequer sobre a ação da Reitoria da USP e da Polícia Militar, e passou a vender a imagem de que os estudantes rebeldes estavam dispostos a quebrar tudo e deixar a vida de seus colegas à mercê de bandidos só para poderem fumar maconha em paz. É muito estranho: o que foi que mudou na realidade brasileira entre a manhã e a noite do dia 27 de outubro de 2011, quando os estudantes tentaram impedir os policiais de levarem três deles para a delegacia? Que metamorfose radical foi essa que fez do Brasil, que era país esculhambado para todo o lado, um baluarte dos valores corretos e civilizados? Que aconteceu com as leis, as instituições, que de repente ficaram perfeitas e bem-acabadas? Que houve com a Polícia Militar que, entre a manhã e a noite dessa quinta-feira, de malvada e despreparada passou a ser composta por paladinos da justiça? É estranho, eu achava que tudo continuava igual, mas muitos gritam que não, sugerem que passamos por uma revolução, e eu, estudando Kant na biblioteca, nem percebi que ela aconteceu.
A Polícia Militar de São Paulo, que, por exemplo, não passou por uma única reestruturação de verdade da época da ditadura para cá, que ostenta uma estrela em seu brasão em homenagem à “Revolução de 1964”, que entre 2005 e 2009 matou mais do que todas as polícias dos Estados Unidos juntas, que tem seus assassinatos arquivados sistematicamente, que não se vê como protetora dos cidadãos e seus direitos, mas presume que são todos culpados e inimigos do Estado, que usa do expediente burocrático chamado “resistência seguida de morte” para encobrir execuções sumárias, que é corrupta... Essa polícia que a população ou teme ou da qual desconfia. Essa polícia que se te enquadrar numa madrugada escura, vai fazer você suar frio, e eu duvido que você não tema, ainda que não deva nada. Pois bem, como é que essa mesma polícia transgressora até mesmo dos direitos mais importantes e básicos, como o direito à vida, pode, do dia para a noite, mudar radicalmente e comparecer à FFLCH que tanto aterrorizou em passados distantes e recentes, apenas para “o estrito cumprimento da lei?”. Se a PM estava lá para proteger a lei, por que entrou no campus, na quinta-feira 27 de outubro último, com parte de seus soldados sem suas tarjas de identificação? Esse expediente é corrente, aliás. Como?
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*Yakov Fidélis Nome fictício; numa universidade com verdadeira liberdade de pensamento, eu não precisaria esconder meu rosto ou meu nome com medo de ser processado pelo reitor ou ameaçado pela polícia por causa deste texto.
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