Código Florestal: retrocesso avança no Senado Federal

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Código Florestal: retrocesso avança no Senado Federal

Por Mayra Lima, Da Página do MST

8/11/2011

A Comissão de Ciência e Tecnologia e a Comissão de Agricultura e Reforma Agrária do Senado aprovaram em sessão conjunta o texto-base do projeto de alteração do Código Florestal Brasileiro. Os destaques e emendas, no entanto, serão apreciados apenas amanhã (09/11), com a proposta de ter tempo para se estabelecer consenso entre os senadores.

O relator, Luiz Henrique da Silveira (PMDB-SC), afirmou que o seu parecer “guarda a essência do projeto da Câmara”, relatado pelo deputado Aldo Rebelo (PCdoB-SP). O senador destacou que sua proposta amplia o projeto da Câmara quando estabelece a separação entre medidas permanentes – que valerão para o futuro – e as medidas transitórias, que tratam do chamado passivo ambiental anterior a 20 de julho de 2008.

“O texto segue privilegiando os ruralistas, tal como saiu da Câmara. Não há a punição de quem agrediu ao meio ambiente, legitimando desmatamentos feitos de forma consciente. É uma manobra para que não haja o pagamento de multas já definidas”, avalia o engenheiro florestal, Luiz Zarref, da Via Campesina.

O relatório do senador Luiz Henrique ainda prevê a criação de um programa de incentivo à preservação e recuperação do meio ambiente. “Mas esse programa não é restritivo para quem, de fato, preserva as áreas de proteção ambiental (APPs) e reserva legal. Possibilitar que grandes proprietários, inclusive os improdutivos, recebam este benefício é uma afronta ao conceito de função social de propriedade”, explicou Zarref.

Agricultura Familiar

O discurso que confunde agricultura familiar e agronegócio foi destaque na reunião. O texto trata de forma igual a agricultura familiar e propriedades com quatro módulos rurais.

Segundo Zarref, a agricultura familiar merece um capítulo a parte diante de suas especificidades. Inclusive, possibilita que médias e grandes propriedades possam se subdividir em propriedades de quatro módulos, ficando isentos de recompor a Reserva Legal desmatada. “O texto ainda não muda a possibilidade de recomposição de reserva legal com espécies exóticas, o que beneficia as empresas de monocultivo de eucalipto”, disse.

O texto faculta a criação de gado e a infraestrutura física associada ao desenvolvimento dessas atividades em APPs consolidadas em região de chapadas, topos de morros, montes, montanhas e serras, com altura mínima de 100 metros e inclinação média maior que 25º, e em altitudes superiores a 1,8 mil metros, qualquer que seja a vegetação.

A matéria seguirá à apreciação da comissão de Meio Ambiente, cujo relator é o senador Jorge Viana (PT-AC). Depois, deve ir à plenário.

Protesto

Enquanto as duas comissões debatiam, estudantes que protestavam contra as alterações do Código Florestal foram violentamente impedidos de entrar na sala de reunião. Um estudante de Geologia da Universidade de Brasília, chamado Rafael, foi arrastado por quatro policiais por cerca de 20 metros, e ao tentar reagir, levou um tiro de phaser (arma paralisante). Ele foi conduzido para a delegacia da polícia legislativa, onde prestou depoimento.

Não é a primeira vez que o Congresso Nacional limita a participação de pessoas que queiram acompanhar as votações dentro das duas casas. Quando da aprovação do texto do projeto na Câmara Federal, a entrada foi restrita aos funcionários da Câmara e o acesso negado ao anexo III, onde fica a entrada mais próxima da Esplanada dos Ministérios e onde há parada de ônibus. Abaixo, veja análise da Via sobre o relatório do Código

O relatório do Senador Luiz Henrique, apresentado na última terça (25/10) na comissão de Ciência e Tecnologia e de Agricultura e Reforma Agrária, mantém o mesmo eixo do projeto aprovado na Câmara dos Deputados, de autoria do deputado Aldo Rebelo.

Houve algumas modificações na estrutura, deixando o texto mais fácil para vetos presidenciais. Separou-se as questões conceituais das questões de regularização. Mas ficou apenas nisso. Os principais pontos problemáticos continuam no texto:

Anistia Serão isentas de recuperação todas as áreas consolidadas até 2008. Nenhuma pena ou exigencia, para quem agrediu o meio ambiente ate 2008. Ou seja, quem está plantando soja transgênica na beira do rio poderá continuar a plantar. É a continuidade da emenda que os ruralistas aprovaram na Câmara, piorando ainda mais o texto do deputado Aldo Rebelo (Artigo 53)

Garante a manutenção de pastagem em topos de morro e bordas de chapada. (Artigo 54 §1º) A pastagem é um monocultivo que praticado em areas de risco, como topos de montanha e beira de rios, traz muitas consequencias ao meio ambiente.

Acesso por parte dos grandes proprietários de fundos públicos para recuperar os desmatamentos que fizeram ilegalmente (Artigo 41, inciso VII)

Data para regularização O texto aceita o conceito de áreas consolidadas para todo o desmatamento feito até julho de 2008. É inaceitável que os desmatamentos feitos já no século XXI sejam considerados como legítimos! O mínimo aceitável seria considerar a data da última alteração do Código Florestal, que ocorreu em 2001. Não há qualquer justificativa, nem legal, nem científica, para que o ano de 2008 seja colocado como data de corte.

Agricultura Familiar Continua tratando igual agricultura familiar e propriedades com 04 módulos rurais. Não trabalhou com um capítulo específico. Nesse sentido, há um acordo construido por todas os movimentos sociais do campo e o movimento sindical, ou seja da contag, fetraf e via campesina, para apresentarmos uma emenda substitutiva no senado, que cria um capitulo específico, apenas para a agricultura familiar. Esperamos que passe nas próximas comissões.

Latifúndio improdutivo O texto considera como área consolidada aquelas que estão paradas, improdutivas, há 10 anos ou menos. Ou seja, além de legitimar o latifúndio improdutivo, o texto possibilita novos desmatamentos, já que com 10 anos a vegetação regenerada já é abundante. (Artigo 3, incisos V e IX)

Copa do Mundo O texto libera o desmatamento em Áreas de Preservação Permanente para eventos internacionais e para construção de estádios, aumentando os grandes impactos da Copa do Mundo e das Olimpíadas. (Artigo 3, inciso VIII, alínea b; Artigo 8, §1º)

Áreas de Preservação Permanente O texto autoriza o plantio de árvores produtoras de frutos ou outros produtos em áreas de APP, abrindo espaço para a citricultura, as borracheiras etc (Artigo 3, inciso X, alínea i)

O texto excluí os apicuns e salgados da categoria de APP, justamente as partes dos Mangues onde se desenvolve a predatória indústria da carcinocultura, ecossistema fundamental para a reprodução de inúmeros animais. Regulariza também todas as industrias da carcinocultura que já estejam instaladas. (Artigo 4, §3º; Artigo 53 §1º)

Novas supressões poderão ser feitas para implantar lavouras, como soja, cana (Artigo 8).

Reduz a APP de 30 para 15 metros para recuperação nos casos que não forem consolidados. (Artigo 54 §1º)

Reserva Legal Permite compensar a reserva legal desmatada dentro do mesmo bioma, possibilitando a criação de desertos verdes imensos, como no caso do estado de São Paulo (tenderá a ser um imenso canavial). Ou seja, o sujeito tem duas propriedades no mesmo bioma, da mata atlantica, por exemplo. Num deles proprio para agricultura ele pode desmatar tudo, e diz que esta conservando o segundo que fica numa encosta, num outro estado.

O texto Permite também que terras compradas de agricultores familiares e tenham reservas, sejam usadas para essa compensação. (Artigo 59)

Mantém a possibilidade de que médias e grandes propriedades possam se subdividir em propriedades de 04 módulos e, com isso, ficarem livres de recompor a Reserva Legal desmatada. Ou seja, mantem a gravidade de que ate 4 modulos (que na amazonia da 500 hectares, nao precisa respeitar a reserva legal de 80% e nem no Cerrado de 40%.;

Continua permitindo a recuperação da Reserva Legal com 50% de espécies exóticas. Ou seja, as grandes empresas de celulose, podem considerar o monocultivo de eucalipto, como parte da reserva legal... Isso vai abrir brecha para entrada rapida do eucalipto na pre-amazonia e de maranhao, e nos cerrados do Piaui..

Cadastro Ambiental Rural Para se regularizar, os grandes proprietários precisarão apresentar apenas um ponto georreferenciado, ficando isento de apresentar o perímetro exato da propriedade. (Artigo 18, §1º)

Mercantilização da Natureza Possibilita que grandes proprietários recebam pagamentos por serviços ambientais para manterem a sua obrigação de preservar APP e RL, invertendo totalmente o conceito de função social da propriedade. (Artigo 42)

Cria a Cota de Reserva Ambiental (CRA), que transforma cada hectare de floresta em títulos que deverão, obrigatoriamente, ser registrados na bolsa de valores. Assim, o capital financeiro transformará nossas florestas em título especulativo! Além do mais, os desmatadores poderão “compensar” as florestas que eram obrigados a proteger comprando na bolsa de valores! (Artigo 46)

Uma vez comercializada a CRA, o agricultor que se arrepender não poderá retirar sua floresta do sistema financeiro, a não ser que o comprador garanta a aquisição de outra área (ou outra cota). (Artigo 49, §1º)

Silvicultura Silvicultura é reconhecida, para fins da Política Agrícola Nacional, igual a agricultura (Artigo 69).

Concluindo, o relatorio do senador Luiz Henrique (PMDB-SC) foi coerente com sua classe, a dos grandes proprietarios de terra. E manteve na essencia, o que ja veio da camara dos deputados. Esperamos que agora as comissões de meio ambiente e de agricultura do Senado, mudem essa logica. E na pior das hipoteses, a Presidenta Vete, os artigos mais estafurdios que colocam em risco o meio ambiente do territorio brasileiro, com graves consequencias para toda sociedade, que vive no meio rural e nas cidades.

Brasilia, 27 de outubro de 2011.

Avaliação da equipe da Secretaria Operativa da Via campesina Brasil.

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