Porque hoje é domingo e o céu de São Paulo, ao menos ele, está limpo

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Poema com sabor de espanto! Teve faxina no céu São Pedro arregaçou as mangas Viu que daquele jeito não dava Onde já se viu? céu plúmbeo? Céu cor de nada? Então mandou água, Água dias a fio, esmerou-se no desafio E transformou céu cinza, nublado, esturricante Num azul de beleza estonteante... O céu de São Paulo está azul, Azulzinho! Repleto de chumaços de algodão Que desenham formas inusitadas Deixando-me, assim, parada Na contra mão. O céu de São Paulo está azul. Azul como o céu de Itaparica Azul como nem meus olhos acreditam Azul como a água que brota na fonte Azul como deve ser todo o horizonte... O céu de São Paulo está azul Azul como os olhos de anjo barroco Azul que me deixa besta, alarmada Dirigindo e olhando para a estrada Para cima, embevecida... O céu de São Paulo está azul Azul dos azulejos portugueses Azul de saudade e degredo Azul que me bota medo... O céu de São Paulo está azul Azul de nostalgia Azul de bolinhas de gude Azul de fotografia... E aqui embaixo está tudo igual: As pessoas continuam agindo como se fosse natural Morrer de cólera, de leptospirose de lombriga e de fome. Morrer sem nome, indigentes encontrados na mata, Nos córregos, nas usinas de traição. As pessoas continuam a viver sem solução Como se fosse natural morrer na contra-mão... E aqui embaixo está tudo igual. O mesmo lixo espalhado nas ruas Anunciando a subida do rio fétido, nojento, podre, feio e escuro, parado, lodento, Com uma insistente capivara a viver em suas margens Mesmo à margem de qualquer consciência... E aqui embaixo está tudo igual. As pessoas insistem em viver marginalmente Como se fosse natural não ter o básico, Não ter emprego, não ter o mínimo E conter os segredos como se fosse destino... E aqui embaixo está tudo igual. Insistimos em viver à margem De qualquer lógica, de qualquer sobrevivência sem desatinos, moto-contínuo Nascer, crescer, viver, morrer no limbo.... Frô, 09/03/99

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