Salvador, 10 de Agosto de 2009
Esta carta impressa, ou eletrônica, chega a sua mão para contar algo que aconteceu comigo, minha família e meus amigos; provavelmente eu sou sua vizinha, amiga ou temos conhecidos em comum.
Meu nome é Vânia Alves Smith Lima, sou jornalista de formação, e moro na Rua Tupinambás, 474. Sou casada há quase 2 anos, com Cláudio Antônio Souza de Jesus. Somos um casal fisicamente diferente, ele é negro, alto, rastafári; eu sou branca, e tenho cabelos encaracolados. Quando nos casamos resolvemos residir onde eu já morava há 4 anos, aqui no rio Vermelho.
No último dia 08 de agosto por volta das 19h30 iniciei, no espaço de convivência do meu prédio, uma festa de comemoração ao meu aniversário, onde eu reuni cerca de 40 convidados; entre eles a família de Cláudio.
Ao realizar a festa já havíamos combinado que o som funcionaria até as 22h e depois diminuiríamos até encerrar por volta da meia noite. Tudo corria bem, estávamos muito felizes, NENHUM VIZINHO DEMONSTROU QUALQUER PROBLEMA COM O SOM. Por volta das 21h30 ouvi algumas pessoas na entrada do prédio conversando com Cláudio, eram dois policiais militares, imaginei que eles estavam falando sobre alguma outra coisa, pois A VIATURA ERA DE ITAPOAN.
A seguir Claudio abaixou o volume do som e assim ficou. Por volta das 23h30, quando alguns convidados já se despediam, me surpreendi de ver um homem alto, muito musculoso, usando short de elástico, camiseta e chinelo, apontando o dedo para Cláudio, na frente de todos dizendo que ele estava preso porque não havia diminuído o volume do som. Ao lado deles estavam DOIS POLICIAIS QUE NÃO PORTAVAM IDENTIFICAÇÃO, um deles ARMADO COM UMA METRALHADORA e outro algemando Cláudio; desci as escadas até onde eles estavam e perguntei: "Gente, o que é isso?". Então me dirigi a este homem de short e ele me respondeu que era autoridade. Reagi e gritei: "saia da minha casa, você não tem o direito de entrar aqui"; ele me respondeu retirando a pistola do short e apontando em direção a minha cabeça. Na hora não pensei em nada só em ficar entre ele e Cláudio, e empurrar aquele homem mesmo armado, e pedia aos policiais "por favor me ajudem, quem é esse homem?" Os policiais nada faziam, e o homem sendo empurrado pegou com a outra mão o celular e dizia, "é melhor vocês subirem, que eles não querem deixar eu levar"; como num passe de mágica mais 3 viaturas apareceram e os policiais arrastaram Cláudio algemado para fora de casa, comigo e mais 20 pessoas que gritavam e se agitavam com tantas armas e policiais na nossa rua, que é apenas de residências e não tem saída. TODOS OS POLICIAIS ESTAVAM SEM A IDENTIFICAÇÃO.
Cerca de 10 policiais começaram a coagir as pessoas e muita gente estava chorando no meio da rua. Foi quando uma viatura chamada por uma das minhas convidadas chegou com um Oficial com identificação que se apresentou, e disse que precisávamos ir a delegacia, pois aquilo estava fora de controle, assim finalmente retiraram a algema de Cláudio e fomos até a delegacia do Rio Vermelho. Lá esperamos a delegada, que colheu as versões e perguntou a Cláudio se ele gostaria que continuasse a investigação e ele disse que sim.
Nossos depoimentos foram agendados. Também fomos a corregedoria da PM e prestamos queixa.
Escrevo, para perguntar a vocês: O QUE É ISSO? Pois no auge da minha idade e experiência não consigo entender, como um vizinho, que mora a 300 metros da minha casa, não vem e conversa comigo sobre qualquer problema, porque um vizinho pegaria uma PISTOLA e colocaria na cintura NO MEIO DA NOITE e entraria na minha casa? Por causa de um som, que ninguém reclamou?
Porque os policiais não tinham a identificação? Porque este homem gritava e humilhava Cláudio na frente da família dele e dos amigos? Porque algemar uma pessoa desarmada e que não oferecia nenhum perigo? O que teria acontecido com Cláudio se eu não reagisse? Se meus amigos não fosse em bloco para a delegacia? Se o policial acionado pela nossa casa não tivesse chegado? Não tenho respostas. E isso me consome. O medo de uma Policia coorporativa que não protege o cidadão nem da arbitrariedade da própria policia, que ataca, que humilha. Estou esgotada de pensar e não conseguir as respostas. Porque infelizmente acho que sei as respostas. Ao fim, isso poderia acontecer com qualquer amigo, vizinho, conhecido, não sou diferente de ninguém.
Meu nome é Vânia Alves Smith Lima, meu RG é 0709630883, moro no AP. 02, fui humilhada e coagida por um homem que dizia ser oficial da PM armado com uma Pistola, de shorts, camiseta e chinelo, que invadiu a minha casa e conseguiu reunir 5 viaturas policiais e cerca de 10 PMs, num sábado a noite, motivado por um som que não incomodou nem aos meus vizinhos de parede. A arma deste homem, além do consentimento dos colegas Policiais, foi sua PISTOLA e a sua "AUTORIDADE".
A minha arma e de Cláudio são as palavras, e minhas testemunhas, que agora passam a ser vocês. Temos medo, mas não vamos desistir da nossa dignidade e nem do direito de resistir a brutalidade, a opressão e ao abuso.
A você que leu esta carta peço ajuda. Resista também, e fique consciente do que esta acontecendo. PRECISAMOS NOS INDIGINAR E TAMBÉM USAR NOSSAS ARMAS. Vânia Alves Smith Lima Lima Comunicação Tels. 71-3240 6344 / 6366 R. Pernambuco nº264, Pituba, sl. 201