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O direito e o avesso
02/07/2008
Por Flávio Santanna Xavier*
"Subdesenvolvimento não se improvisa. É obra de séculos." (Nelson Rodrigues)
*Flávio Santanna Xavier é Procurador Federal.
Por Flávio Santanna Xavier*
"Subdesenvolvimento não se improvisa. É obra de séculos." (Nelson Rodrigues)
Repugna à consciência republicana que no limiar do terceiro milênio a questão agrária, em nosso Estado, seja tratada como mero caso de polícia.
É da democracia que segmentos sociais ou grupos políticos se contraponham à concretização da reforma agrária, que parcela da opinião pública mire seu descontentamento em determinado método de luta pela terra ou que advogue melhores resultados nos projetos de assentamentos então existentes.
É da essência do Estado democrático de direito - assim se crê - que o Ministério Público defenda a ordem jurídica, coibindo eventual excesso ao direito associativo e à livre manifestação de pensamento na exata perspectiva de que nenhum princípio constitucional - consagrador de direito individual - é absoluto, notadamente quando a ele se contraponham outros princípios, de idêntica hierarquia constitucional, como o da paz social ou da ordem pública.
Todavia, não se admite que ocorrendo colisão desses direitos sua harmonização simplesmente anule, em absoluto, um deles, especialmente quando parte da argumentação que o ancora tenha nítido matiz político-ideológico, ao se utilizar de pregações com orientação marcadamente contrária à reforma agrária. É que um dos fundamentos do Estado democrático de direito é o pluralismo político, não se podendo, a priori, condenar ou absolutizar determinada corrente de pensamento. E, ademais, a reforma agrária, a par de servir ao debate acadêmico ou diletante, está assentada constitucionalmente como um dos primados da ordem econômica nacional.
Transformar a questão agrária em prioridade da segurança pública é privilegiar o desforço físico como forma de solver conflito social, além de ocultar a responsabilidade estatal na promoção dessa importante política pública. É semear a cultura da violência em ambiente já bastante conturbado.
A questão agrária deve ser superada com outros instrumentos, dentro da legalidade. Grande parte da opinião pública desconhece que os atuais parâmetros informadores do conceito de propriedade improdutiva, e portanto, passível de desapropriação, datam do longínquo ano de 1980.
Enquanto no RS a cultura do arroz irrigado tem, hoje, uma produtividade média de 5,93 ton/ha, o Incra utiliza o índice de 3,4; o trigo tem 1,83 e o Incra advoga 0,8; o milho de 2,97 e o Incra com 1,4; a soja com 1,66 e o Incra usa 1,4. Com tal descompasso - em aberto confronto com o artigo 11 da Lei 8.629/93 - , inúmeras propriedades rurais estão a salvo da sanção estatal e por isso os números de assentamentos minguam a cada ano nestas paragens, tensionando sobremaneira o meio rural.
Não haverá solução do impasse sem a harmonização entre a propriedade e o cumprimento de sua função social. Esta a raiz do problema: a total incapacidade estatal em promover a reforma agrária no Estado, manietado - com o silêncio de todos, inclusive dos Ministérios Públicos - que está em promover esta importante política pública. Os pobres do campo - assim se imagina - continuarão lutando por seus direitos. É que como diria Juan Rulfo: "Que me deixem ao menos o direito que os enforcados têm, o de agitar as pernas".
É da democracia que segmentos sociais ou grupos políticos se contraponham à concretização da reforma agrária, que parcela da opinião pública mire seu descontentamento em determinado método de luta pela terra ou que advogue melhores resultados nos projetos de assentamentos então existentes.
É da essência do Estado democrático de direito - assim se crê - que o Ministério Público defenda a ordem jurídica, coibindo eventual excesso ao direito associativo e à livre manifestação de pensamento na exata perspectiva de que nenhum princípio constitucional - consagrador de direito individual - é absoluto, notadamente quando a ele se contraponham outros princípios, de idêntica hierarquia constitucional, como o da paz social ou da ordem pública.
Todavia, não se admite que ocorrendo colisão desses direitos sua harmonização simplesmente anule, em absoluto, um deles, especialmente quando parte da argumentação que o ancora tenha nítido matiz político-ideológico, ao se utilizar de pregações com orientação marcadamente contrária à reforma agrária. É que um dos fundamentos do Estado democrático de direito é o pluralismo político, não se podendo, a priori, condenar ou absolutizar determinada corrente de pensamento. E, ademais, a reforma agrária, a par de servir ao debate acadêmico ou diletante, está assentada constitucionalmente como um dos primados da ordem econômica nacional.
Transformar a questão agrária em prioridade da segurança pública é privilegiar o desforço físico como forma de solver conflito social, além de ocultar a responsabilidade estatal na promoção dessa importante política pública. É semear a cultura da violência em ambiente já bastante conturbado.
A questão agrária deve ser superada com outros instrumentos, dentro da legalidade. Grande parte da opinião pública desconhece que os atuais parâmetros informadores do conceito de propriedade improdutiva, e portanto, passível de desapropriação, datam do longínquo ano de 1980.
Enquanto no RS a cultura do arroz irrigado tem, hoje, uma produtividade média de 5,93 ton/ha, o Incra utiliza o índice de 3,4; o trigo tem 1,83 e o Incra advoga 0,8; o milho de 2,97 e o Incra com 1,4; a soja com 1,66 e o Incra usa 1,4. Com tal descompasso - em aberto confronto com o artigo 11 da Lei 8.629/93 - , inúmeras propriedades rurais estão a salvo da sanção estatal e por isso os números de assentamentos minguam a cada ano nestas paragens, tensionando sobremaneira o meio rural.
Não haverá solução do impasse sem a harmonização entre a propriedade e o cumprimento de sua função social. Esta a raiz do problema: a total incapacidade estatal em promover a reforma agrária no Estado, manietado - com o silêncio de todos, inclusive dos Ministérios Públicos - que está em promover esta importante política pública. Os pobres do campo - assim se imagina - continuarão lutando por seus direitos. É que como diria Juan Rulfo: "Que me deixem ao menos o direito que os enforcados têm, o de agitar as pernas".
*Flávio Santanna Xavier é Procurador Federal.