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Matilda Ribeiro e racismo
Os gastos do cartão da ministra
Em nosso País sempre quiseram associar o racismo à questão de classe. É muito comum nos dias de hoje dizer que se o negro estudar e prosperar na vida a discriminação acaba. Em um período não muito distante, nos anos de chumbo, quando as diferenças ideológicas entre direita e esquerda eram mais acentuadas, ouvíamos com freqüência dos companheiros de esquerda a seguinte frase: "No dia em que a revolução vencer e construirmos uma sociedade mais justa e igualitária o problema do racismo acabará". Em contrapartida, ouvíamos da direita que esse mal só teria fim no dia em que o negro tivesse dinheiro e status para comprar tudo, inclusive a consciência dos racistas.
Matilda Ribeiro e racismo
Os gastos do cartão da ministra
Em nosso País sempre quiseram associar o racismo à questão de classe. É muito comum nos dias de hoje dizer que se o negro estudar e prosperar na vida a discriminação acaba. Em um período não muito distante, nos anos de chumbo, quando as diferenças ideológicas entre direita e esquerda eram mais acentuadas, ouvíamos com freqüência dos companheiros de esquerda a seguinte frase: "No dia em que a revolução vencer e construirmos uma sociedade mais justa e igualitária o problema do racismo acabará". Em contrapartida, ouvíamos da direita que esse mal só teria fim no dia em que o negro tivesse dinheiro e status para comprar tudo, inclusive a consciência dos racistas.
Enquanto a utopia da revolução ou do enriquecimento que compra consciências não chega continuamos sendo indistintamente discriminados, seja qual for nossa posição ideológica ou cargo que ocupemos neste País.
A face mais perversa desse racismo é exposta quando essa elite majoritariamente branca, acostumada a ocupar todos os espaços privilegiados dos quais ela se acha dona por direito, vê suas posições ameaçadas ou ocupadas por negros. Aí, sem disfarçar e muitas vezes com requintes de crueldade tenta nos punir com o que há de mais sórdido, que é questionar a posição ou atitude que teoricamente poderia ser exercida somente por brancos. Os exemplos vão dos mais banais, como a polícia parar um negro em um carro de luxo, que habitualmente seria ocupado por um branco, até o desrespeito às autoridades públicas negras.
A história recente do País tem mostrado tratamentos diferentes quando o acusado é negro. Por, exemplo, em São Paulo, vários foram os prefeitos e até governadores acusados de desvio de dinheiro público; entre eles houve inclusive quem pregasse o slogan "Roubo, mas faço". Todos foram investigados, todos negaram e somente um foi afastado por Impeachment e saiu preso do Congresso Nacional, "coincidentemente", um negro, Celso Pitta.
O atual Governo Federal tem sido campeão em investigações envolvendo seus auxiliares. Bastou apenas uma suspeita de uma viagem para "orar" com dinheiro público para que a ex-governadora e ministra Benedita da Silva fosse banida do governo e quase da vida pública brasileira, sem direito se quer de se defender, posição muito diferente da adotada com os vários brancos que posteriormente foram acusados de corrupção envolvendo milhões. Todos tiveram pleno direito de se defender, serem julgados ao bom tempo e gosto da justiça brasileira, e em alguns casos acabaram obtendo mais poder do que tinham antes das acusações.
A bola da vez desse tratamento desleal e racista da elite brasileira tem sido a ministra Matilde Ribeiro, da Seppir – Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial. Em que pese o gasto demasiado da ministra em seu cartão corporativo, o que queremos refletir aqui é a forma como ela tem sido julgada, não pelo costumeiros milhões de verbas públicas que assistimos todos os dias nos noticiários, até porque isso nem seria possível, uma vez que sua secretaria conta com um dos menores orçamentos da União, abaixo, inclusive, de várias estatais.
Mas a ministra está sendo julgada por gastar o seu cartão com aluguéis de carros e despesas em hotéis de luxo e viagens, benefícios permitidos apenas a elite branca neste País.
O que mais deprime no racismo tupiniquim é que não se queira refletir que a maioria dos hotéis e os lugares onde a ministra tem gasto seu cartão, o negro só consegue entrar ou como serviçal ou na condição de ministro, e, se estiver na segunda posição, estará cumprindo um papel social que é o de disfarçar a vergonhosa exclusão em que estamos metidos neste País subdesenvolvido até na forma de expressar seu racismo.A maioria dos lugares onde, segundo as denúncias da imprensa, a ministra tem gasto seu cartão realmente só são freqüentados pela elite branca, o que logo nos faz levantar a dúvida, a indignação das denúncias se devem ao gasto do dinheiro público, ou a presença de uma mulher negra em um espaço branco dessa sociedade? Por que será que não foram concedidas as mesmas manchetes e o mesmo espaço para falar, por exemplo de outra negra, a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, que teria tido o menor gasto entre os ministros? Por que será que não se dá mesmo espaço que se deu, e com todos os méritos, quando o Governador José Serra, quando foi intitulado como melhor ministro da saúde do mundo, ao ministro Gilberto Gil, que recentemente no Canadá foi homenageado como melhor ministro da Cultura do mundo?
Se juntarmos o dinheiro da passagem que derrubou Benedita da Silva, os gastos do cartão de Matilde Ribeiro não dão um milionésimo do que tem sido denunciado de desvios de verbas públicas Brasil nos últimos meses, porém se juntarmos os destaques e manchetes produzidas pelo gasto do cartão da ministra dá a impressão que está em curso uma revolução no País, e infelizmente não é na ética hipócrita das elites racistas brasileira.
Maurício Pestana é presidente do conselho editorial da Revista Raça Brasil
pestana.raca@escala.com.br