O que mais me espanta neste episódio de barbárie, intolerância, abuso de poder, de racismo institucionalizado sim e de um profundo desrespeito religioso é que nem à época na qual vivíamos os duros anos da primeira república um fato deste seria permitido. Sim por que ele foi anunciado. Mãe Rosa foi aos jornais falar das ameaças que estava sofrendo. Em 22/02 ela conseguiu espaço na imprensa baiana, no mesmo jornal que nos anos de 1930 fazia, juntamente com outros periódicos, uma intensa campanha contra os terreiros, contra as religiões de matrizes africanas, desmerecendo-as, não as tratando como religiões legítimas.
Naqueles anos duríssimos, muitos terreiros foram fechados, o povo santo preso, os objetos sagrados apreendidos pela polícia. Durante esse período as perseguições aos terreiros eram feitas na calada da noite, os terreiros eram interditados e reabertos, mas trator e marreta usada sob a égide do poder público, em pleno século XXI, merece reação imediata e coordenada não apenas do movimento negro e do povo de santo, mas também merece que toda a sociedade civil indigne-se e exija reparações.
As lideranças religiosas do candomblé sempre resistiram a esses ataques e lutaram de diferentes formas pra continuar a prática de sua religião e de seus rituais. Diante das batidas policiais, escondiam seus objetos sagrados e diziam que cultuavam santos católicos, como São Cosme e São Damião, outros fundavam seus terreiros em lugares bem afastados do centro de Salvador, outros ainda buscavam a proteção de pessoas consideradas importantes na sociedade e ainda havia os que enfrentavam a perseguição afirmando que “sua religião não era nem mais nem menos do que qualquer outra, pedindo saúde e felicidade, como faziam a religião católica, os espíritas” (afirmação publicada em 01/06/1932 no Jornal A Tarde, que deu destaque a ela para deslegitimá-la).
Voltando a Salvador de fevereiro de 2008, pergunto: se o poder público é agente de barbárie, de desmandos, de desrespeito contra um templo sagrado ao povo de santo, o que esperar dos fanáticos religiosos que vivem destruindo monumentos religiosos como os Orixás da Prainha (Brasília DF) esculpidos pelo artista Taty Moreno? Como podemos ter esperanças que esses atos de profundo desrespeito e fanatismo tenham fim?
Só mesmo seguindo os conselhos de Ras Adauto:
O Brasil com o seu racismo ciníco e violento, há poucos dias denunciado pelo relatório da ONU, deve ser abolido de vez. E nós temos que ser os agentes dessa nova ordem, pela dignidade do nosso povo e pelas Mães de Santo ofendidas na Bahia...
O nosso Obama somos nós mesmos/as, aqui e agora. Ou é Zumbi ou nada!!!"
Conceição Oliveira.
Obs1. As informações sobre a década de 1930 e as perseguições aos terreiros foram originalmente publicadas em PARATODOS- História, São Paulo: Scipione, 2004, volume 2, p. 74-75.
Obs.2. Para avançar nesta discussão da longa duração de perseguição, intolerância e resistência das religiões afro-brasileiras, Indico também a leitura do texto de LÜHRING, Angela. “acabe com esse santo, Pedrito* vem aí...” Revista USP, n. 28. Dossiê do povo negro- 300 anos. *Pedrito era como era chamado um dos mais truculentos delegados que Salvador já conheceu.
Leia também o contundente texto de Ras Adauto sobre esse episódio publicado aqui
01/03/2008
Prefeito exonera titular da Sucom, Kátia Carmelo, como forma de reparar danos pela demolição de terreiro
Perla Ribeiro e Osvaldo Lyra
Como uma forma de mostrar que a prefeitura de Salvador voltou atrás e assumiu o compromisso de reparar todos os danos materiais causados com a destruição do terreiro Oyá Onipó Neto, o prefeito João Henrique Carneiro (PMDB) exonerou ontem a arquiteta Kátia Carmelo, da Superintendência de Ordenamento de Uso do Solo (Sucom). A medida, que também teve caráter político, foi considerada pequena pelo povo-de-santo, já que ela foi mantida no comando da Secretaria de Planejamento. Esta foi uma resposta do prefeito à sociedade, que se mostrou indignada com a demolição do templo, autorizada pela própria gestora na última quarta-feira.
Fontes ligadas a João Henrique informaram que, com a proximidade das eleições, ele se sentiu no dever de dar uma resposta à população em função da derrubada do templo sagrado. Além disso, a estratégia pode fazer parte da negociação do Executivo com o Partido Democrático Trabalhista (PDT), que retornou anteontem à base de sustentação da administração municipal. Alheios a pendengas políticas, os militantes da causa alegaram que o repúdio não era direcionado à própria Carmelo, mas sim, ao disparate executado pelo órgão.
A proprietária do terreiro, Roselice Santos do Amor Divino, mais conhecida como Mãe Rosa, e os defensores da causa, já haviam afirmado que a questão não acabaria ali. Além da reparação material, eles exigiram também a moral. Queriam que o prefeito se retrate publicamente para o povo-de-santo.
Repúdio - Numa reunião com representantes das secretarias da Reparação, Habitação, Governo e a Companhia de Desenvolvimento Urbano de Salvador (Desal), a prefeitura anunciou uma proposta de reparação do terreiro, localizado na Avenida Jorge Amado. Apesar de tentarem aparar as arestas, minimizando o desgaste, a mãe-de-santo, peça-chave do encontro, se negou a dividir o mesmo espaço com a gestora Kátia Carmelo, que acumulava as funções de secretária de Planejamento e superintendente da Sucom. “Não vou agüentar ficar na sala com esta mulher”, afirmou mãe Rosa. Logo em seguida, Kátia Carmelo foi convidada a se retirar.
Antes mesmo de a demissão se concretizar, já havia um movimento favorável à repreensão. “Não é suficiente que o prefeito se retrate publicamente. Queremos que ele aplique uma ação enérgica sobre a secretária, que, sem a determinação dele, como o próprio informou, de forma arbitrária, autorizou a demolição do terreiro”, destacou o babalorixá do centenário Oxumarê, Silvanilton Encarnação da Mata.
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Reconstrução será iniciada
No encontro, ficou acordado o início imediato da reconstrução das áreas destruídas, assim como reposição de peças e instrumentos sagrados atingidos, como imag ens de orixás, vestuário e objetos utilizados nos rituais religiosos. A prefeitura também se comprometeu a realizar um estudo no local para avaliar a possibilidade de regularização fundiária ou remanejamento do terreiro. Entretanto, a comunidade quer também a garantia de que a situação não se repetirá em nenhum outro terreiro.
“É preciso que todas as instâncias administrativas tenham consciência de que não dá mais para tratar os templos religiosos como um espaço qualquer”, considerou o coordenador geral do Coletivo de Entidades Negras, Marcos Rezende. Ainda não há como estimar o valor do prejuízo material, mas há um fato incontestável para mãe Rosa: o dano moral não tem preço. “Eles me causaram um dano muito grande, não vão conseguir tapar minha boca com uma venda. Eles fizeram o escândalo deles, quebraram os orixás e agora acham que podem reparar suspendendo uma parede”, bradou mãe Rosa, que acabou se retirando da reunião antes do fim, em decorrência de uma queda de pressão.
Com o intuito de mostrar serviço, ontem mesmo a Desal enviou três engenheiros para inspecionarem o local onde será reerguido o novo templo. O início das obras estava previsto para ocorrer hoje, mas, por decisão da própria família de mãe Rosa, acabou sendo adiado para segunda-feira. De forma enfática, eles garantem que as mobilizações irão continuar. E, no mesmo dia em que os tijolos devem movimentar a construção, o grupo volta ao Ministério Público para discutir o andamento da ação. “Onde fica a nossa moral? Fomos feridos e nossa dignidade não tem preço. Estamos rezando para que o prefeito se sensibilize e se retrate”, disse o vice-presidente da Associação Brasileira de Preservação da Cultura Afro-Ameríndia, Otávio Silva.
Em apoio à Ialorixá, militantes dos movimentos negros e do culto afro fizeram vigília no terreiro ontem à noite. Mais do que a repercussão local, o episódio já circulou o país inteiro e até mesmo ultrapassou as fronteiras além-mar. Só no Brasil, entidades de 20 estados já se solidarizaram com a causa. Do exterior, chegaram mensagens da Espanha, Itália, Alemanha e de Portugal.
Aqui Salvador, Correio da Bahia, 01.03.2008
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Do site da vereadora Olívia Santana
29/02/2008 17:56:27
Violência
Olívia pede explicações sobre a demolição do Oyá Onipó Neto
"Vieram dez homens da SUCOM acompanhados de três viaturas da Polícia Militar e ordenou a demolição do espaço sagrado, mesmo sem possuir documento em mãos que comprovasse a determinação por ordem da superintendente Kátia Carmelo". Esse relato é do presidente da Associação Brasileira de Preservação da Cultura Afro Ameríndia (AFA), Leonel Antonio Monteiro Pinto.
A ação da prefeitura de Salvador, realizada na última quarta-feira (27) pela Superintendência de Controle e Ordenamento do Uso do Solo do Município (SUCOM), chocou a vereadora Olívia Santana. Parte do terreiro Oyá Onipó Neto, localizado na Avenida Jorge Amado, no bairro do Imbuí foi demolido. "Tudo foi destruído! Indumentárias, adereços, objetos de valores significativos foram destruídos", Pinto.
Olívia Santana visitou as ruínas para levar condolências à Mãe Rose de Matamba, responsável pelo Oyá Onipó Neto. A vereadora prometeu entrar com um requerimento na Câmara Municipal do Salvador para solicitar aos órgãos competentes pela ação informações detalhadas e os motivos desse ato.
"O Terreiro já funciona há 28 anos naquele local. Depois de tanto tempo destroem e alegam que o terreno é uma área pública. Isso não é compreensível", afirma Olívia Santana. No mesmo dia ela entrou com o requerimento no Poder Legislativo Municipal. Agora, é preciso aguardar o posicionamento da superintendente da SUCOM, Kátia Cristina Gomes Carmelo.
Apesar do alegado pela SUCOM, que o terreno é público, Mãe Rose possui um documento de posse, paga IPTU, conta de água e luz e cumpre com todos os impostos instituídos pela prefeitura de Salvador. Inclusive, o Oyá Onipó Neto está incluído no projeto de Mapeamento dos Terreiros de Salvador.
Para o presidente da AFA esse é mais um ato de intolerância religiosa. "O sentimento de todo povo de santo é de que tudo aquilo que construímos foi jogado no chão, por falta de respeito", desabafa.
Outra informação dada pela SUCOM é que existe uma ação movida pelos moradores contra o terreiro. "Nunca houve protesto algum e o presidente da Associação de Moradores da São Camilo pode afirmar isso. Ele mesmo desmentiu junto ao Ministério Público", esclarece Pinto.
Cabe citar que não conseguimos entrevistar Mãe Rose para essa matéria, pois a mesma continua em estado de choque. O prejuízo da ação é incalculável. "Ainda não avaliamos a perda material, mas a perda maior, sem dúvidas, é a nossa fé, a falta de respeito ao próximo, a arrogância e a frieza da secretaria Kátia Carmelo que conduziu o Oyá Unipó Neto ao declínio material", conclui Pinto.
Destaque para esse artigo de Ulisses Passos que também relembra dentre outros aspectos autoritários na história de Salvador contra os terreiros do delegado Pedrito:
ESCRAVIDÃO E RACISMO TEOLÓGICO – A CANAÃ BRANCA DOS PURITANOS
Por: Ulisses Passos. Acadêmico de Direito, Pan-Africanista e Presidente do CNNC/BA. Pseudônimo: Aswad Simba Foluke. E-mail: ulisses_soares@hotmail.com
“A injustiça em qualquer lugar é uma ameaça para a justiça em todos os lugares. Estamos presos numa rede de reciprocidade, da qual não se pode escapar, ligados por um mesmo e único destino.”
Martin Luther King Jr.
Infelizmente em Salvador, cidade mais preta do Brasil, um local de culto religioso do povo preto foi destruído
em quase sua totalidade: O terreiro Oyá Onipó Neto, cuja proprietária e Sacerdotisa é Roselice Santos do Amor Divino, mais conhecida como Mãe Rosa.
A ordem da demolição foi dada pela Prefeitura de Salvador através da SUCOM - Superintendência de Controle e Ordenamento do Solo do Município - caracterizando novamente uma postura racista de um Estado que não foi pensado para a população preta, com suas bases filosóficas e atitudes cunhadas na escravidão e na repressão ao povo preto e suas culturas.
Tal atitude me recorda às histórias narradas por meus avós e pais, a respeito das perseguições e ataques aos candomblés na Bahia. Todos nós imaginávamos que fatos como esse não mais ocorreriam. A população mais velha de Salvador chegou a conhecer o delegado Pedro Azevedo Gordilho, chamado de Pedrito, grande perseguidor dos cultos afro-brasileiros entre as décadas de 20 e 40 do século passado, não o primeiro e como vemos nem o último aparato estatal de repressão e racismo com o povo preto. Tradições orais e cantigas descrevem a ação do delegado:
“...Ouvia-se um tropel de cavalos; era a policia que a mando do ‘Homem’, vinha acabar com aquela manifestação de negros, ‘coisa de gente ignorante, primitiva... ’
... O barulho das patas dos animais estava mais e mais perto: sentia-se o cheiro de cavalos. Filhas de santo entravam em pânico, pensando no pior: surra dos policias, atabaques furados, saias rasgadas...” (Azevedo e Martins, 1988, PP.23-4).
Diversas reportagens sobre a perseguição dos cultos eram escritas por jornais de grande circulação, em Salvador, em que a imprensa apóia a perseguição de cultos do povo preto. Trecho do jornal A TARDE:
“Nesses antros de feitiçaria, dispersos pela cidade, ocorrem scenas monstruosas impressionantes, não raro victimando os imprudentes que se pretas às bruxarias.
A polícia ignora e fechas os olhos propositadamente [...]
Uma campanha cerrada de imprensa levou a polícia a perseguir os ‘candomblés’”. (Jornal A Tarde, 29/05/1923);
Destruições dos locais de culto também foram descritos no livro de professor Walter Passos: Bahia: Terra de Quilombos, em que uma Igreja da Assembléia de Deus fora destruída por grileiros no quilombo do Rio das Rãs.
“Informante- Francisco Amaral de Souza, Presidente do Sindicato dos trabalhadores Rurais.
Os moradores estão na terra há mais de 100 anos, atualmente os membros da comunidade estão ameaçados de expulsão pelo fazendeiro e grileiro Carlos Newton Vasconcelos Bufem e seus pistoleiros. Há matanças indiscriminadas de animais, destruição das lavouras e benfeitorias, envenenamento dos rios e lagoas e outras violências. Em 1974 o grileiro Celso Teixeira mandou demolir as casas e barracos dos moradores e o prédio da Igreja Assembléia de Deus, e em seguida mandou passar o trator”. (Walter Passos, Bahia Terra de Quilombos. 1996, p-34)
A história e a prática da democracia brasileira precisam ser questionadas, enquanto houver privilégios por causa da cor epitelial. O CNNC como uma entidade panafricanista, respeitando a ancestralidade do Povo Preto e defendendo sua manutenção, se solidariza e indigna-se juntamente com os outros irmãos e irmãs em protesto contra a demolição de um local de culto de origem africana, defendo nossa união do nosso povo na diáspora. As nossas concepções de fé são contra qualquer injustiça que venha atingir o nosso povo no planeta, estamos ligados no mesmo cordão umbilical da Mãe – África, independente das concepções e de nossas práticas religiosas. É necessário compreender as raízes que condiciona uma elite branca no poder a ter práticas diferenciadas para organizações caucasianas e organizações pretas no Brasil, sendo assim, a compreensão do racismo teológico e a escravidão permite-nos dirimir atitudes discriminatórias quando se refere ao nosso povo.
A CANÃA BRANCA DOS PURITANOS
Vivemos em uma sociedade onde os valores cristãos-brancos sejam católicos ou protestantes são considerados “superiores e civilizados” e os valores africanos são tratados como inferiores e atrasados, a continuidade de uma sociedade dicotômica herdada: senhores brancos cristãos X escravizados pretos não cristãos. E o poder e meios de produção continuam nas mãos de brancos cristãos, frutos da exploração do trabalho escravizado de homens e mulheres africanas e seus descendentes.
O protestantismo quando chegou nas 13 colônias da América trazido por colonos ingleses, conhecidos como puritanos, praticantes de uma interpretação literal da Bíblia, se consideravam o “O Novo Israel de Deus", “Os Eleitos" e “diziam” possuir toda a autoridade para interpretar os textos bíblicos e vivê-los literalmente na “Terra dada por Deus”, também se consideravam expulsos da Inglaterra, governada pelo faraó, o rei inglês, e atravessaram o Mar Vermelho, nome que deram ao Oceano Atlântico, e viram os povos nativos, os aldeões coletores como as nações de Canaã que deviam ser destruídos para que eles tomassem posse da Terra Prometida. Essa mesma visão puritana veio com os missionários norte-americanos para o Brasil e se tornou o arcabouço das igrejas evangélicas no Brasil.
O racismo teológico tem uma das suas origens na racialização da Bíblia e na prática do cristianismo eurocêntrico pelos Puritanos, dogmatizando a teologia, corrompendo a exegese e a hermenêutica, embranquecendo e ocidentalizando para usufruir através do tráfico mercantilista a exploração de civilizações livres e primevas africanas e destruição de civilizações nas Américas.
Os puritanos se consideravam e ainda se consideram através de seus seguimentos pelo planeta como os herdeiros de Deus e donos do mundo,torna-se interessante o texto abaixo e as interpretações dos Puritanos abalizando o direito de escravizar os africanos.
"E quanto a teu escravo ou a tua escrava que tiveres, serão das gentes que estão ao redor de vós; deles comprareis escravos e escravas.
Também os comprareis dos filhos dos forasteiros que peregrinam entre vós, deles e das suas gerações que estiverem convosco, que tiverem gerado na vossa terra; e vos serão por possessão perpetuamente os farei servir" – (Levítico- 25: 44-46).
A falsa interpretação teológica dos puritanos dos textos bíblicos foi usada como certidão de posse do planeta e de seus habitantes. Dentro do protestantismo especialmente o Reformado no final do culto o pastor abençoa a comunidade e ouvi diversas vezes as seguintes palavras:
- O amor de Deus Pai, a Graça de Deus Filho e as Consolações do Deus Espírito Santo, sejam com todos vós e com todo o Israel de Deus espalhado pela face da terra.
A idéia do “Novo Israel” é uma prática puritana de interpretação bíblica e sê-lo é deter uma nova Canaã literalmente falando, sendo assim, os puritanos se sentiam abençoados e cumprindo a vontade divina, só que este Novo Israel era habitado nas Américas, Oceania e na África por populações pretas as quais foram condenadas a uma vida de inferno. A escravidão tornou-se um decreto divino, porque os puritanos brancos se consideram predestinados a herdarem a terra, sendo formulada uma proposta terrena de uma Nova Canaã Branca e protestante, impondo as suas filosofias deformadas e praticas racistas pelas elites no poder e repetidas pela população branca e pobre, conseguintemente na iconografia religiosa, nas teologias, na estética, nos meios de comunicação, na relação capital X trabalho, nos livros didáticos, e especialmente no poder político que afeta o direito a vida e do bem comum dos africanos e seus descendentes.
As graves conseqüências da “idéia de um novo Israel branco e Puritano”, além da pilhagem, exploração e escravidão fizeram com que surgissem as maiores aberrações raciais nos Estados Unidos da América e na África do Sul, legislações baseadas na idéia de uma “Nova Canaã Branca”: leis conhecidas como Jim Crow, as quais você pode acessar lendo o artigo no blogger do CNNC/BA e a instituição do Apartheid na África do Sul.
O racismo é uma ideologia fomentada pela população branca no planeta e introjeda dentro da população preta através da religião cristã, ser preto e cristão, sem o conhecimento do panafricanismo, do afrocentrismo e do cristianismo de matriz africana é coadunar com a exploração e ser repetidor da opressão ideológica e da racialização bíblica.
O cristianismo surgiu na África e onde estão às igrejas mais antigas do planeta e infelizmente os caucasianos se apropriaram de terras, menos da Etiópia, a qual nunca foi escravizada e é detentora das igrejas cristãs mais antigas da história do cristianismo.
Nós do CNNC sabemos que temos uma longa trilha a percorrer para alertar com voz profética que o cristianismo europeu e sua ideologia de uma nova Canaã são anti-bíblica e baseada no racismo.
O CNNC (Conselho Nacional de Negras e Negros Cristãos) tem a sua presença nas discussões do Movimento por fazer parte da sua proposta de atuação o Panafricanismo. O CNNC é uma organização Cristã no Movimento Negro e não um grupo separado de Movimento Negro Evangélico. Um só Povo e um só luta.
Uma das preocupações do Movimento Negro Brasileiro é construir uma proposta de poder para a maioria da população; surgem incipientes idéias de partidos políticos que desejam partidarizar o movimento e colocam os seus representantes, as vozes dos grupos oprimidos sexualmente, das mulheres, da juventude, de representantes religiosos, etc. Sendo uma “novidade” ainda não digerida por muitos militantes a presença nas discussões dos chamados evangélicos, digo “novidade”, porque os chamados evangélicos sempre estiveram no movimento negro, apenas não assumiam essa postura, por medo e vergonha da grande maioria, por saberem da culpabilidade do cristianismo deformado pelos europeus, e sendo seus seguidores, não ousavam contestar o racismo das igrejas protestantes, sendo eles mesmo vítimas. Sendo um dilema de muitos pastores e membros pretos assumir a sua identidade de africano no Brasil, temendo desagradar as Estruturas Eclesiásticas as quais ajudam a manter. A maior prisão é a mental.
Infelizmente, dentro do mundo protestante brasileiro alguns pastores pretos ainda legitimam a escravidão nos seus escritos quando tentam dirimir leis do Primeiro Testamento e repetem interpretações errôneas expondo literalidade dos textos bíblicos. Nenhum tipo de escravidão fez parte dos planos de Deus para a humanidade e quando observamos as vozes dos profetas condenando as vontades humanas, entendemos que as leis de exploração do homem pelo homem eram vontades de pessoas presunçosas e afastadas de Javé. A escravidão nunca foi corroborada pelos desígnios de Deus e não podemos amenizar a maior covardia e genocídio praticado contra os nossos ancestrais. O Senhor não predestinou nenhuma pessoa preta, seres originais criados a imagem e semelhança Dele, para ser escravizada por qualquer europeu e seus descendentes, eles foram seqüestradores e o que foi nos roubado tem que ser devolvido; o termo reparação e cotas devem ser mais bem trabalhados por aqueles (as) que tentam fazer verdadeiramente uma teologia preta, a qual tem tido uma bela interpretação através do teólogo Kefing Foluke.
Os praticantes da escravidão violaram todos os mandamentos divinos e rasgaram o Sermão do Monte e literalmente prestarão contas dos seus atos no dia do Juízo Final, porque usaram o nome do Eterno para invadir, seqüestrar, escravizar e matar os seres originais e continuam afastados do evangelho. O Povo Preto tem a promessa do Reino de Deus conforme as palavras de Yeshua no Sermão do Monte:
E a justiça tem que ser conquistada, não cai do céu, é uma construção e luta diária de todos e todas. Uni-vos povo preto em luta pela justiça.