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Carla Akotirene
É difícil iniciar estas linhas, mas não podemos nos abster de falar da exoneração da nossa guerreira negra – Matilde Ribeiro.
Como é sabido, seis jovens negras, oriundas do Instituto Cultural Steve Biko, referência do movimento negro em ações afirmativas, fundaram no dia 22 de maio de 2005 o NUMAR – Núcleo Matilde Ribeiro/ Universidade Católica do Salvador.
A pretensão foi a de provocar o debate sobre a viabilidade das políticas públicas compensatórias em que o Serviço Social se insere. Considerando não somente o perfil majoritário negro das graduandas, mas principalmente o perfil da população usuária, assistida pelas (os) profissionais da área.
Entendíamos que a história de Matilde Ribeiro se confundia com a nossa: Negra, ex-trabalhadora doméstica, com uma base familiar de resistência e dignidade e, assim como alguma de nós, já havia caminhado pelas ruas, recusando convites para todo o tipo de sorte.
Assim como nós, a Matilde Ribeiro empenhou – se nos esforços para Ser, para ingressar numa universidade, mesmo sabendo que somente através da aceitação de algumas sortes e da franca solidariedade do movimento negro organizado, seria possível a permanência numa universidade burguesa.
Então ingressamos no curso de Serviço Social, este cuja trajetória, buscou a superação do assistencialismo paternalista através de uma reestruturação teórico-conceitual e a construção de um Projeto Ético Político Profissional na defesa, da equidade, democracia, ética, justiça e liberdade.
Por conta disso, a falta de probidade administrativa de quem quer que seja ou ainda a motivação para tal, contrariam os princípios anunciados em nossa atuação e entendimento acerca da Questão Racial. Acreditamos que o Estado é inoperante, casuístico e fragmentado, logo necessita de pessoas com virtudes políticas e capacidade técnica para mudá-lo, transformá-lo e revolucioná-lo.
Que possam ingressar nos aparatos de sociedade política, sem consolidar o formato vigente e sim contribuir para uma contra - hegemonia.
Ao menos entre nós mesmas, não justificaremos as nossas falhas, nem das mulheres e homens negros, exemplificando as falhas previstas, dos não negros envolvidos em corrupção - como Calheiros, Dirceu, Maluf e tantos outros. A nossa postura é de enfrentamento ideológico e não manutenção de status quo.
A Universidade Católica do Salvador vive um momento de êxtase total. Anteriormente expresso pela política financeira excludente direcionada aos negativados, aos alunos de humanas, essencialmente negras (os) estigmatizados de caloteiros, desonestos, daqueles que deveriam saber que academia não é o seu lugar. Um ministério então... Um cartão...
Agora o alunado racista da instituição tem o respaldo da imprensa para questionar o real compromisso das (os) negras, com as desigualdades étnicas - raciais protagonizadas pelo Estado Brasileiro.
Este segmento ironiza - nos pelo fato de termos ostentado um orgulho por no governo que passa por este Estado haver uma mulher negra. Em tempo, digo que havia uma ministra de políticas de promoção da igualdade racial.
Agora o cenário político faz com que as perversidades dos comentários satíricos dos intelectuais racistas se modernizem; e os risos agora sejam mais sinceros e menos discretos.
Há constatação de que o NUMAR estava esvaziando a sua atuação, por conta de suas próprias limitações, agora se esvazia com mais velocidade; através da desfiliação de jovens negras de pertencimento étnico recente, do reduzido número de associados à comunidade no orkut (53 membros). E o não consentimento das demais integrantes para falar sobre este assunto.
Mas, esta situação serviu para nortear mais uma reflexão: por que os Nossos heróis e heroínas o são depois que não estão mais entre nós?
Foi por isso que homenageamos uma mulher viva, real, com falhas e imperfeições. Pois alguns de nossos heróis são mitos revolucionários.
Para sobrepujar o racismo é que conseguimos lê onde não está escrito.Portanto mais que nunca, queremos interpretar da nossa forma a demissão de Matilde Ribeiro ocasionada pela mídia racista.
Que interpretemos as coisas ainda não ditas, registradas e simbolizadas. Porém precisamos muito saber de Matilde Ribeiro. Solicitamos saber...
Os registros mais nobres que temos desta forte mulher é: “melhor ter brancos ressentidos do que não ter negros na Universidade”. Com esta mesma coragem e serenidade a Matilde Ribeiro recentemente disse: “foi um erro administrativo que pode e deve ser corrigido”
Então que viva nós! Enquanto estamos vivos para nos fortalecermos como humanos, negras e negros que erraram na história e, ainda muito hão de errar. Porque os nossos antepassados também erraram.
Longe de nós sermos um povo santo.
Salve Ganga Zumba! Salve! Matilde Ribeiro!
... porque o racismo não dá descanso!
"Não se pode esperar que o fato de um povo ser oprimido leve todos os indivíduos a serem virtuosos e dignos. O importante é que as características da maioria sejam a decência, a honra e a coragem." Luther King.
Carla Akotirene