Maria e João

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Era uma vez duas crianças, Maria e João, que viviam com sua mãe e seu pai em um casebre muito pobre. O pai, lenhador, era um homem muito triste e muito bravo, que trabalhava para uma carvoaria. Sua vida era tirar as vidas das árvores e, assim, de tudo o que dependia delas para viver. Com o passar dos anos, essa profissão de morte o enchera de uma amargura tão profunda que ele passara a tratar mal sua família, muitas vezes agredindo seus filhos e sua esposa. A comida começou a faltar com cada vez mais frequência, e o lenhador foi se tornando cada vez mais violento. A mãe, preocupada com o bem-estar das crianças, de coração partido resolveu enviá-las para trabalharem para uma madame que morava distante dali, acreditando que assim as protegeria da cólera de seu pai e da fome que os rondava. Assim, aos poucos, ela começou a tentar convencer seu companheiro de que seria mais fácil viver sem Maria e João, pois teriam menos bocas a alimentar. Ele foi se acostumando com a ideia, até que acabou concordando com ela. Captura de tela de 2015-12-20 16:20:55À noite, as crianças ouviam seus pais conversando. Em pouco tempo compreenderam que estavam prestes a ser mandadas embora. Isso lhes causou grande tristeza, pois elas não queriam viver longe da mãe e preocupavam-se com o que poderia acontecer-lhe quando ela ficasse sozinha, tornando-se o único alvo da ira do pai delas dali por diante. A mãe não conseguia conversar com Maria e João a respeito, porque sabia que se negariam a ir. Não tinha coragem de lidar com suas reações. No dia da partida, o pai os levou até a cidade onde morava a madame, dando instruções de como chegarem na casa dela. João, no entanto, mais velho que Maria, já aprendera a ler e, no caminho, foi decorando as placas e referências; tão logo seu pai virou as costas, pegou Maria pela mão e correu para procurar um meio de voltar. Bem próximo dali, por coincidência, acabou encontrando uma mulher que estava indo visitar sua família perto de onde eles moravam. Indicou a ela o caminho e ela os deixou em casa antes mesmo de anoitecer. O pai os encontrou na porta e ficou estupefato. Enraivecido por ser contrariado, pegou-os pelos braços e arrastou-os para outra cidade, ainda mais longe, sob ameaças de maiores agressões caso não fossem, largando-os no centro, sem ter para onde ir, sem saber o que fazer. Chorando, as crianças se abraçaram. Estava escuro e elas estavam cercadas por pessoas estranhas, desconhecidas, barulhentas. De repente, um perfume delicioso de pão fresco enroscou-se em seus narizes. A fome acordou e abafou o medo. Fisgados pelo aroma aconchegante, seguiram-no até uma casa grande e muito bonita. Em uma de suas janelas estava um pão recém-assado, esfriando para poder ser comido. João não queria pegar aquele pão, porque sabia que era de outra pessoa. Mas eles estavam com tanta fome! Não resistindo, arrancou um pedaço e repartiu com sua irmã. Queria sair correndo em seguida, mas o pão estava tão bom, tão gostoso, tão quentinho... que ele pegou outro pedaço. E outro. E outro. E logo eles haviam comido o pão todo. - Ah, vocês estão com fome? - eles ouviram subitamente, e tomaram um susto tão grande que até pularam. Era a dona da casa, uma doceira famosa e rica, que os observava. Ela então abriu sua porta para eles, dizendo: Venham, podem entrar, venham comer. Quando eles entraram na casa, a mesa estava posta para o jantar com várias comidas gostosas. Sem qualquer hesitação, as crianças lançaram-se sobre os quitutes, devorando-os até fartarem-se. Foi só depois de eles estarem com a barriga bem cheia, sem poderem correr, que a senhora, com uma colher de pau na mão, sentou-se à mesa com eles e disse: - Agora vamos conversar sobre como vocês vão me pagar pelo que comeram. Captura de tela de 2015-12-20 16:21:40Maria, espantada, disse: - Mas você não nos disse que teríamos que pagar para comer. Não temos dinheiro. Ao que a mulher respondeu, com uma gargalhada: - O quê? Achou que eu iria alimentá-los de graça? Você, menina, vai trabalhar aqui na minha casa. Vai arrumar e limpar e cozinhar para mim todos os dias. E você – ela olhou para João – eu vou achar formas para que você seja útil. Mas você precisa primeiro encorpar um pouco. – ela disse, apertando os olhos enquanto o olhava detidamente. - Mas, se vamos trabalhar aqui, vamos precisar comer, daí vamos ter que pagar com mais trabalho, mas vamos continuar comendo. Não vamos sair nunca! - Pois é - disse a senhora, com frieza. Deveriam ter pensado nisso antes de comer o meu pão na janela... Os olhos de Maria encheram-se de lágrimas grossas de indignação: - Pensar como? Estávamos com fome demais para pensar! Agora vamos pagar pelo resto das nossas vidas? Isso não é justo! - Isso não é problema meu, menina atrevida! Não seja insolente! - disse a senhora, ostentando a colher de pau ameaçadoramente. Nos dias que se passaram, Maria passou o dia trabalhando arduamente sob o olhar atento da doceira, que a seguia pela casa, brandindo sua colher de pau sempre que ela parava para descansar. À noite, ela dormia no chão frio da cozinha, sobre o tapete sujo. João ficava sempre trancado em um dos quartos, com barras na janela; havia um buraco na porta por onde sua irmã lhe passava comida. Ele chorava de raiva e impotência enquanto a ouvia trabalhar. Como queria estar lá fora, nem que fosse para limpar e arrumar a casa junto com ela! Não era justo que ela tivesse que fazer tudo sozinha. A madame o mantinha preso para evitar que ele se juntasse com Maria e conseguissem fugir, já que ele era maior. Por isso, levava a chave do quarto sempre consigo, pendurada em um cordão em volta de seu pescoço. Um dia, a doceira encasquetou que Maria deveria limpar um lustre muito alto e por isso ela precisaria subir numa escada muito velha e capenga. Um perigo. Na verdade, o que ela queria era empurrar e matar Maria, porque estava ficando com medo do dia em que a menina estaria mais forte que ela. Maria, no entanto, muito inteligente, percebeu isso. Quando a senhora mandou que limpasse o lustre, ela disse: - Mas como? - Limpe o lustre, oras! - a outra respondeu, rispidamente. - Mas é muito alto e eu não alcanço... - É para isso que serve a escada! Captura de tela de 2015-12-20 16:27:47- Mas mesmo com a escada eu não alcanço... A doceira parou, encarando-a com muita raiva. Em seguida falou: - Como não alcança? Você é só um pouco mais baixa que eu e veja como eu alcanço facilmente – e subiu na escada – Veja, veja, menina preguiçosa, é só você subir... E Maria rapidamente empurrou com força a escada e a criatura maldosa caiu de lá de cima, quebrando o pescoço. Maria pegou a chave e abriu a porta do quarto. Os irmãos se reencontraram e se abraçaram e saíram correndo da casa. Antes de saírem, no entanto, pegaram o livro de receitas da velha doceira. Já na rua, por sorte, encontraram a mesma mulher que antes os levara para casa. Ela se chocou com o estado das crianças, prontificando-se a retorná-las aos seus pais. Lá chegando, foram recebidas de braços abertos por sua mãe que as agarrou chorando e pedindo perdão por tê-las enviado para longe. O pai não estava mais ali. Com o livro de receitas, a mãe pode se tornar uma grande doceira e a família viveu feliz para sempre.

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Espero que tenham gostado! Estou planejando fazer um livro infantil com essa história, ilustrado pelo meu amigo César. Acho que vai ficar bem legal, aguardem! =)