Escrito en
BLOGS
el
Você já ouviu a expressão “Trigger Warning”?
Trigger Warning, ou TW, é um alerta que se coloca no começo de um texto para que as pessoas saibam da existência de um conteúdo ali que pode servir de gatilho (daí o nome, em inglês, “trigger” - gatilho, e "warning" - alerta) para um eventual trauma, desencadeando memórias e sensações dolorosas ligadas a ele.
Como variadas são as pessoas e seus traumas, nem sempre temos como saber o que as atingirá dessa forma. Pode ser que alguém tenha um problema com algo aparentemente inocente, talvez uma fobia de abelhas, por exemplo, e por isso ver qualquer coisa que trate de abelhas para ela seja um trigger.
No entanto, há assuntos em que essa possibilidade é bastante previsível. Quando falamos de violência, por exemplo, é provável que alguém que nos leia a tenha vivenciado de alguma forma. Por isso, é uma questão de sensibilidade avisar as pessoas disso.
Quando alguém coloca o “trigger warning” (“TW: abelhas”, por exemplo), não está dizendo que acha que o assunto é nojento, vergonhoso, que não se deveria abordá-lo ou algo assim. Está apenas comunicando que acha possível ou mesmo provável que outras pessoas tenham algum trauma com aquilo.
Similarmente, quando alguém identifica algo como trigger e pede para ser avisade quando forem falar disso, usando o TW correspondente, o intuito não é censurar, ou transformar aquilo em tabu. É deixar explícito que se tem um trauma ligado a isso e que se gostaria de poder optar por não passar naquele momento pela avalanche emocional que aquilo causa.
Não é censura. Não é silenciamento. Não é reforçar a opressão. É reconhecer que algumas pessoas não lidam bem com um determinado assunto e, por uma questão de empatia, avisar quando for falar disso, ainda que não se compreenda o porquê da dificuldade.
É entender que não é factível (e não seria direito, ainda que fosse factível) regular o trauma ou não trauma alheio. E que impor às pessoas que lidem com seus conteúdos sensíveis sem que isso tenha partido delas é uma forma de violência e, isso sim, um silenciamento. Porque trata o trauma de outrem como se não fosse legítimo, a dor de outrem como se não fosse digna de ser sentida ou verbalizada. E quem somos nós para estabelecer isso? Será que, ao invés de recriminar, não seria melhor tentar empatizar?
Bato muito nessa tecla da empatia porque, para mim, é a base do meu feminismo, é o que constrói a minha noção de sororidade, de humanidade.
Uma vez, numa discussão, uma pessoa disse que empatizar com uma determinada moça que havia agido de uma forma que ela considerava machista era reforçar o patriarcado. Eu discordo, e com veemência. A empatia vai contra tudo o que o patriarcado representa. A empatia é o que fará o patriarcado ruir.
Empatizar é abrir mão de certo e errado, de ganhar ou perder, de concordar ou discordar, de culpar, de julgar. É encontrar o ser humano por detrás das palavras e dos atos. É se abrir para sentir junto com alguém algo que não é confortável de sentir, mas que essa pessoa precisa de companhia para conseguir atravessar. É uma dádiva.
O que seria a sororidade senão ir além da rivalidade que somos criadas para sentir umas em relação às outras para vermos nas mulheres com quem interagimos nossas irmãs na mulheridade, com muito mais em comum que de diferença? Nos abrirmos para acolhermos suas dores a despeito de as entendermos ou não, nos abraçarmos mesmo em nossa discordância?
Para mim, empatizar não é concordar. Sororidade não é defender o ponto de vista que não é nosso. É justamente entender que a concordância não é mais importante do que a comunicação e que é possível o entendimento mesmo na discordância.
O trauma de uma pessoa não é uma agressão a outra. O pedido de respeito a esse trauma não é silenciamento de quem não o tem. E a empatia não deveria ser reservada só para as pessoas com quem é fácil a gente empatizar.