O professor e cientista político Daniel Cara esteve no Fórum Onze e Meia desta segunda-feira (9) e comentou sobre a política de despejo protagonizada pelo prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes (MDB), e pelo governador, Tarcísio de Freitas (Republicanos). Em maio deste ano, Nunes divulgou que cerca de 5 mil famílias serão removidas para a construção de uma estrutura para conter enchentes que assolam o bairro.
O anúncio foi feito logo após reunião com o governador Tarcísio e o CEO da Sabesp, Carlos Piani. A previsão é que a obra tenha início ainda em junho e seja finalizada em 2029. Na época, Nunes afirmou que o objetivo é “delimitar a área e evitar novas ocupações”. “Não permitiremos mais, em hipótese alguma, a ampliação das ocupações, senão daqui a pouco vai chegar lá em Guarulhos”, declarou.
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Como resposta à política violenta de remoções, os moradores de Jardim Pantanal e outros quatro bairros vizinhos realizaram um protesto na manhã desta segunda-feira (9). A campanha Despejo Zero também anunciou um ato na quarta (11) para se opor às remoções. Segundo a organização, 34 comunidades estão sob risco de despejo em São Paulo.
Na avaliação de Daniel Cara, que acompanha a situação das famílias de Jardim Pantanal desde 2020, a política de despejo significa, na prática, a "assunção do fracasso de Nunes".
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"Só que as pessoas não abordam dessa forma, porque ele [Nunes] disse que tinha resolvido o problema do Jardim Pantanal e boa parte da comunidade acreditou. É importante dizer que a base de vereadores do Nunes tem uma participação muito intensa ali naquela região. Então, a comunidade, as lideranças comunitárias, foram levadas a se convencer de que as coisas estavam funcionando pelos vereadores vinculados ao Nunes. Mas o fato é que eles agora desistiram de tudo que disseram que tinham feito e querem fazer a remoção das famílias", afirmou Cara.
O professor ainda alertou que. se a sociedade não "impuser freios" a Nunes e Tarcísio, "eles vão ser tão ou mais destrutivos do que o Bolsonaro". "Porque o Bolsonaro anunciava a maldade, a gente tinha a capacidade de reagir, e o Nunes e o Tarciso simplesmente vão fazendo", avaliou Cara.
"É algo que a gente precisa observar, porque tudo tende a estabelecer um cenário em 2026 que, mesmo que o Tarciso não apareça na urna presidencial, certamente ele estará na urna do estado de São Paulo, e a grande aposta dele é ser a alternativa ou para 2026 ou para 2030, e trabalhando de maneira totalmente imbricada com o Ricardo Nunes", acrescentou o professor.
Governo Zema
Além de Tarcísio e Nunes, o governador de Minas Gerais, Romeu Zema (Novo), também promove uma política violenta contra comunidades vulneráveis. Neste domingo (8), o político declarou que pessoas em situação de rua deveriam ser removidas igual carro em local proibido, através de guindastes. Para o educador, a única diferença de Zema para Tarcísio e Nunes é que o governador de Minas não tem "nenhum descomedimento".
"Ele simplesmente fala o que pensa, e o que ele pensa é esse tipo de coisa. É inaceitável ter um governante que atua contra o próprio povo", afirmou o professor. "O Zema tem uma faceta que é muito parecida com a do Bolsonaro; ele não tem receio de expressar o ódio que ele sente pelas pessoas", acrescentou.
Na visão do professor, Zema fez a declaração sobre as pessoas em situação de rua justamente porque, após os governos de Michel Temer e Jair Bolsonaro, o número de pessoas nessas condições "explodiu". "Está impossível viver nas cidades. Não tem salário que pague aluguel".
"É uma situação calamitosa e a gente precisa rapidamente recuperar o projeto civilizatório no Brasil e também políticas públicas que deem conta de apoiar pessoas que estão sofrendo fortemente com a especulação imobiliária no Brasil inteiro. E o Zema é uma figura da especulação imobiliária, assim como o Ricardo Nunes e o Tarcísio também são", acrescentou Daniel.
Radicalização do discurso
O educador também analisou a radicalização do discurso de políticos que tentam disputar o espólio de Bolsonaro, como Tarcísio, Zema e Ronaldo Caiado (União Brasil). O professor explicou que, até 2008, uma lei da Ciência Política avaliava que, durante o processo eleitoral, o eleitor tendia ao centro. "No entanto, numa época pautada pela comunicação pública, organizada pelas plataformas sociais e pelo próprio algoritmo, o que gera engajamento é a polarização", afirmou.
Portanto, o que gera engajamento hoje é se apresentar de forma sectária. "Todos eles estão disputando o espólio Bolsonaro. Ou seja, eles precisam trazer para eles o exército que faz barulho, que é minoritário, mas faz barulho", destacou.
Por fim, Cara disse que o que é necessário na política hoje é ter um exército engajado, o que a extrema direita tem de sobra. Apesar de não ter maioria, a extrema direita tem "um grau de dedicação e intensidade assustador", segundo o professor. "Eles têm uma capacidade de mobilização que é inegável. É só ver o que acontece nas manifestações de rua. Então, eles [políticos] estão tentando ganhar esse grupo para depois tentar conquistar os demais eleitores".
Confira a entrevista completa do cientista político Daniel Cara ao Fórum Onze e Meia
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