ELEIÇÕES 2026

Daniel Cara defende que esquerda deve prestar mais atenção à eleição para o parlamento

Ao Fórum Onze e Meia, professor e cientista político discutiu articulação para as próximas eleições; educador também debateu mudanças no Ensino a Distância

Daniel Cara, professor da USP.Créditos: Vinícius Loures/Câmara dos Deputados
Escrito en POLÍTICA el

O professor da USP e cientista político Daniel Cara esteve no Fórum Onze e Meia desta quinta-feira (22) para debater os cenários possíveis para as eleições de 2026, que vão eleger presidente da República, governadores, senadores e deputados, além de outros temas da política brasileira. O educador comentou sobre os possíveis candidatos a substituírem o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), que está inelegível por oito anos, e cobrou maior atenção do campo progressista para as eleições do parlamento. 

Na visão de Daniel, Tarcísio de Freitas (Republicanos), governador de São Paulo e um dos principais nomes cotados para substituir Bolsonaro, deverá focar na reeleição pelo estado em vez da candidatura à presidência, pois tem mais chances de ser reeleito. 

"Tarcísio não quer trocar o certo pelo duvidoso. O certo é que, infelizmente, a chance dele se reeleger em São Paulo é muito grande, a não ser que a população tome consciência daquilo que é a tragédia do governo Tarcísio. Mas ele é muito blindado, ele tem uma aliança muito sólida com a velha imprensa de São Paulo", afirmou o professor. 

Além disso, Daniel disse que tanto Bolsonaro quanto o Partido Liberal (PL) "têm consciência" de que para ter um candidato de fato competitivo pela extrema direita relacionado ao ex-presidente, é preciso ter o nome "Bolsonaro" na cédula. Porém, a ex-primeira dama Michelle Bolsonaro, que também começou a aparecer como um dos principais nomes que seriam indicados, não deve conseguir avançar como candidata, na visão do professor. Para ele, Michelle deve se candidatar ao Senado, com altas chances de ser eleita com recorde de votos.

Diante disso, o educador analisou que o ex-presidente deve indicar um dos filhos para a presidência, com maior chance de ser Eduardo Bolsonaro (PL-SP). O professor argumentou que Flávio Bolsonaro (PL-RJ) não deve ser indicado, pois não tem carisma e já enfrentou problemas anteriores quando passou mal durante debate para as eleições à prefeitura do Rio de Janeiro em 2016. 

"O Flávio não consegue ser a alternativa do bolsonarismo, então eu creio que vai ser Eduardo Bolsonaro, que tem feito viagens internacionais para vários países, em especial agora foi para a Alemanha. É uma figura que, de fato, tem constituído laços com os vários setores da extrema direita dos Estados Unidos e está se tornando um interlocutor viável para todos eles", destacou o professor. 

Em relação ao embate com o presidente Lula, Daniel afirmou que o deputado não deve ter força e carisma para enfrentá-lo, mas é o candidato "mais viável na lógica bolsonarista". 

No entanto, destacou que tão importante quanto a eleição presidencial é a eleição do parlamento, principalmente para o Senado Federal, e que o campo progressista não tem dado a atenção devida. "A grande questão para mim continua sendo o fato de que nosso campo não tem observado da maneira como deveria observar a eleição para o parlamento", afirmou o professor. 

"A gente deve ter um um resultado pífio para o Senado Federal e o bolsonarismo está construindo uma aliança com a direita, com o centrão, inclusive com o próprio Kassab, que vai dar as condições de eleger pessoas do centrão e pessoas de extrema direita", alertou Cara. O professor acrescentou que, em sua ideologia, o centrão é, na verdade, de extrema direita. 

Daniel também avaliou que em relação a essas alianças, a ministra Gleisi Hoffmann, da Secretaria de Relações Institucionais, está fazendo um "belo trabalho" de articulação política no Congresso, mas que ainda é  "insuficiente". Porque é difícil conseguir vencer a barreira ideológica. "O centrão é extrema direita na sua grande maioria. O próprio Arthur Lira comprova isso", disse. 

"Então, o cenário precisa ser bem observado em relação ao parlamento e as últimas movimentações do presidente Lula demonstram uma preocupação, na minha opinião, insuficiente com a questão parlamentar", lamentou. 

O professor argumentou que essa postura do presidente se dá porque ele deve tomar uma decisão: "ou ele se reelege, ou ele coloca energia em duas eleições". "Ele não quer dividir energia, ele está, de fato, imbuído de resolver a questão e promover o mal menor que é uma reeleição apertada. É claro, mal menor no sentido de que, se ele pudesse, o ideal seria se dedicar à eleição e também se dedicar às eleições parlamentares que vão ser dificílimas", afirmou Daniel.

Por fim, o professor ressaltou que as próximas eleições serão "o momento mais difícil da história recente do Brasil pós-Constituição de 1988". 

Nova Política de Educação a Distância 

Outro tema discutido pelo professor foi a Nova Política de Educação a Distância, regulamentada pelo presidente Lula nesta segunda-feira (19). As regras estabelecem que cinco cursos serão proibidos de acontecer somente na modalidade EaD. São eles: Medicina, Direito, Odontologia, Enfermagem e Psicologia. O objetivo da mudança foi garantir maior qualidade na educação. 

Uma questão que surgiu com as novas regras foi em relação ao motivo do curso de Direito também estar na lista. Cara explicou que o curso foi incluído devido ao péssimo desempenho das faculdades privadas de baixo custo e baixa qualidade no exame da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). Na visão do professor, isso revela que a educação de qualidade é a presencial. "Se for para ter escala, a educação de qualidade é presencial", defendeu. 

O professor afirmou que a Educação a Distância pode ser bem mobilizada em casos de cursos de extensão e cursos no geral, mas não para a formação profissional superior. "Para formação na educação básica em especial, a educação a distância não cabe", avaliou. 

Daniel ainda explicou que, na prática, a norma vai servir para o setor privado, uma vez que nas universidade públicas não existe o modelo de presencialidade considerado nas novas regras, que é ter  70% de atividades presenciais e 30% de atividades a distância. Ele acrescentou que no Brasil não há uma norma sobre a educação presencial plena, o que há é uma prerrogativa da autonomia universitária.

"Na prática, Medicina, Psicologia, Enfermagem, são áreas que vão ter 70% de presencialidade. Para as licenciaturas teria que ser 100% de presencialidade. Eu estou sendo bem franco, eu sou formador de professores e não dá para fazer a distância a formação de professores. Você pode fazer um curso de especialização, de aperfeiçoamento, mas formação de professor, formação inicial não dá para ser a distância", disse Daniel. 

Na opinião do professor, o novo decreto é um avanço do governo Lula em relação ao governo de Michel Temer. No entanto, ele ressaltou que o avanço foi "numa modalidade de oferta da educação superior extremamente precária", e que vai continuar sendo precária mesmo com a mudança, devido ao histórico de desmonte da Educação durante o governo Temer. 

"O decreto foi um pequeno avanço, que não é tão pequeno assim, porque o setor privado de educação é riquíssimo, tem um enorme poder de lobby. Então, foi um pequeno avanço diante do terror do Michel Temer, mas tem muito que a gente avançar ainda para garantir a educação superior de qualidade no Brasil", finalizou. 

Confira a entrevista completa do professor Daniel Cara ao Fórum Onze e Meia

Siga o perfil da Revista Fórum e da jornalista Júlia Motta no Bluesky.

Reporte Error
Comunicar erro Encontrou um erro na matéria? Ajude-nos a melhorar