A cidade do conhecimento. Bibliotecas gigantescas e a casa dos filósofos. Foi destruída duas vezes por impérios estrangeiros
Essa já foi considerada uma das cidades mais importantes do mundo e da história, centro de conhecimento e cultura
Muito antes das metrópoles modernas se tornarem polos de cultura e erudição, o mundo antigo já testemunhava o surgimento de uma cidade projetada para ser o coração do saber: Bagdá.
Fundada em 762 d.C. pelo califa Al-Mansur, a capital foi cuidadosamente planejada como a joia do Califado Abássida, uma dinastia que governou o vasto mundo islâmico entre 750 e 1258 d.C.
O Califado Abássida
Os Abássidas chegaram ao poder após derrubar os Omíadas, transferindo a capital do império de Damasco (na Síria) para a recém-fundada Bagdá, às margens do rio Tigre, no atual Iraque.
O novo califado buscava consolidar não apenas o poder político, mas também o prestígio intelectual do Islã. Sob seu domínio, o império se tornou um mosaico multicultural, onde persas, árabes, turcos, gregos e indianos conviviam e trocavam ideias.
Durante o chamado “Período de Ouro Islâmico” (séculos VIII a XIII), os Abássidas incentivaram o estudo, a tradução de obras antigas e o desenvolvimento científico.
O árabe tornou-se a língua internacional da ciência, e Bagdá — sua capital — o ponto de encontro de pensadores de todo o mundo conhecido.
No coração de Bagdá surgiu a lendária Casa da Sabedoria (Bayt al-Hikma), fundada por volta do século IX.
Financiada pelos califas Harun al-Rashid e Al-Mamun, a instituição abrigava estudiosos de diversas religiões e origens, dedicados à tradução de textos clássicos e à produção de novos conhecimentos em matemática, medicina, astronomia, filosofia e engenharia.
Entre seus nomes célebres estavam Al-Khwarizmi, considerado o pai da álgebra, e Al-Razi, um dos pioneiros da medicina experimental.
Foi ali que se consolidaram as bases de disciplinas que influenciariam o Renascimento europeu séculos depois.
A primeira destruição: o cerco mongol de 1258
O esplendor de Bagdá e do Califado Abássida terminou abruptamente em 1258, quando o exército mongol liderado por Hulagu Khan, neto de Gêngis Khan, sitiou a cidade.
Após semanas de resistência, Bagdá caiu — e o massacre foi devastador. Relatos históricos descrevem o rio Tigre escurecendo pela tinta dos livros jogados na água e pelas cinzas das bibliotecas incendiadas.
O califa Al-Musta'sim, último da dinastia Abássida em Bagdá, foi executado, encerrando uma era de mais de 500 anos de domínio e de florescimento cultural. O mundo islâmico jamais voltaria a ser o mesmo.
A segunda destruição: a guerra moderna
Mais de sete séculos depois, Bagdá voltou a ser palco de ruína. Em 2003, durante a invasão do Iraque pelos Estados Unidos, a cidade sofreu intensos bombardeios e uma nova onda de destruição cultural.
Museus e bibliotecas foram saqueados, incluindo a Biblioteca Nacional do Iraque, que abrigava manuscritos abássidas e documentos mesopotâmicos raríssimos. Parte da herança intelectual que resistira por séculos foi novamente perdida.
(foto: wikipédia)
A cidade abriga hoje universidades, centros de pesquisa e instituições voltadas à restauração de arquivos e manuscritos históricos.
O legado do Califado Abássida — sua abertura ao conhecimento, à ciência e à diversidade — ainda são referência no Oriente Médio, servindo como inspiração para a reconstrução e resgate de algo que algum dia foi.