Em meio a tensões comerciais e incertezas globais, a China anunciou novas diretrizes econômicas para a segunda metade de 2025. A reunião do Politburo do Comitê Central do Partido Comunista da China (PCCh), realizada nesta quarta-feira (30), estabeleceu medidas para sustentar a recuperação econômica, estimular o consumo interno e aprofundar reformas estruturais, preparando o país para o 15º Plano Quinquenal (2026-2030).
O anúncio ocorreu após a confirmação de que o PIB chinês cresceu 5,3% no primeiro semestre, superando as expectativas e demonstrando resiliência diante das pressões externas, como a intensificação das tarifas impostas pelos Estados Unidos. Segundo dados oficiais, o consumo doméstico foi o principal motor desse resultado, respondendo por 52% da expansão do PIB, ao lado do avanço dos setores de alta tecnologia e serviços.
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Diplomacia em Estocolmo e a disputa tarifária
A disputa comercial entre China e EUA ganhou novo capítulo no fim de julho. Autoridades dos dois países se reuniram em Estocolmo, nos dias 28 e 29 de julho, em negociações que somaram mais de cinco horas, para discutir a extensão da trégua tarifária de 90 dias, originalmente firmada em maio e válida até 12 de agosto.
Atualmente, produtos chineses enfrentam tarifas de 30% nos EUA, enquanto a China aplica 10% sobre itens estadunidenses. Embora Pequim tenha declarado que houve “consenso” para a extensão da trégua, Washington afirmou que a decisão final depende do aval do presidente Donald Trump.
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O secretário do Tesouro dos EUA, Scott Bessent, descreveu as conversas como “construtivas”, destacando temas como exportações de minerais críticos, tecnologia de uso dual e compras chinesas de petróleo russo.
Já o porta-voz Guo Jiakun, do Ministério das Relações Exteriores da China, reafirmou que Pequim seguirá os entendimentos anteriores entre Xi Jinping e Trump, defendendo um diálogo baseado em “igualdade, cooperação e benefícios mútuos”.
Reação às pressões externas e fortalecimento do mercado interno
Diante de tarifas mais altas e de um ambiente global instável, a China aposta no consumo doméstico como motor de crescimento. No primeiro semestre, o consumo final foi responsável por mais da metade do PIB. As novas diretrizes incluem ampliar setores essenciais, como saúde, educação infantil e cuidados com idosos, considerados estratégicos para impulsionar a demanda interna.
Pequim busca consolidar e expandir a tendência de recuperação econômica com três frentes principais:
1. Política fiscal mais ativa
- Emissão acelerada de títulos: cerca de 4,4 trilhões de yuans (cerca de US$ 616 bilhões) em títulos especiais locais e 1,3 trilhão de yuans (cerca de US$ 182 bilhões) em títulos do Tesouro para financiar infraestrutura e programas de renovação de consumo.
- Déficit público ampliado: meta elevada para 4% do PIB, com orçamento projetado em 5,66 trilhões de yuans (cerca de US$ 793 bilhões).
- Incentivos ao consumo: programas como o de troca de eletrodomésticos e veículos antigos por novos, com financiamento de 300 bilhões de yuans (cerca de US$ 42 bilhões).
2. Crédito para inovação tecnológica
- Expansão de linhas de crédito para setores estratégicos, como semicondutores, biotecnologia e veículos elétricos.
- Bancos públicos foram orientados a reduzir juros para empresas emergentes e indústrias de alta tecnologia.
3. Apoio a pequenas e médias empresas (PMEs)
- Isenções tributárias e linhas de financiamento especiais para PMEs.
- Programas de digitalização e assistência técnica, com foco no emprego urbano.
Essas ações buscam enfrentar riscos como a desaceleração do consumo, tarifas dos EUA e a crise prolongada do mercado imobiliário. Para o economista Zhang Linshan, da Academia Nacional de Desenvolvimento da China, em entrevista à Xinhua, a combinação de estímulos fiscais e monetários é essencial para “sustentar o crescimento sem ignorar riscos financeiros, especialmente relacionados às dívidas locais”.
Reformas estruturais e inovação
O encontro também reafirmou a inovação como motor do crescimento, com foco em:
- Integração entre pesquisa científica e indústria;
- Criação de um mercado único nacional;
- Estímulos à economia privada e empreendedores;
- Expansão de zonas de livre comércio e adoção de padrões internacionais para atrair investimentos.
Planejamento estratégico para o futuro
O Politburo também abordou riscos financeiros e anunciou medidas de requalificação urbana para apoiar o setor imobiliário. Além disso, destacou que a preparação do 15º Plano Quinquenal (2026-2030) será prioridade, com foco na modernização tecnológica e maior abertura econômica.
Mesmo com as tarifas dos EUA e tensões geopolíticas, Pequim aposta no mercado interno robusto, inovação e diplomacia econômica para sustentar o crescimento e manter seu protagonismo global.
Confiança global na economia chinesa cresce
Durante o encontro, a economia da China foi descrita pelo Politburo como “sustentada por bases estáveis, múltiplas vantagens, forte resiliência e grande potencial”. Uma pesquisa da CGTN (2023-2025), com 47 mil pessoas em 46 países, mostrou aumento da confiança na economia chinesa: 74,7% (2023), 81,3% (2024) e 81,9% (2025).
Em 2025, 89,5% elogiaram o desempenho econômico da China e 86,4% reconheceram sua contribuição para a economia mundial, com aprovação acima de 90% entre jovens (18–44 anos). África, América do Sul e Ásia foram as regiões mais favoráveis, com 95,6%, 92,9% e 85,6%, respectivamente.
O estudo apontou ainda que 79,8% veem o mercado chinês como uma oportunidade e 78% afirmaram que seus países se beneficiam do comércio com a China. Ao comparar os ganhos comerciais, 48,3% dos entrevistados preferem a China aos EUA (20,1%).
As iniciativas mais bem avaliadas incluem o fortalecimento da indústria e inovação tecnológica, além de políticas de abertura econômica de alto padrão.
Confira aqui a pesquisa completa (em inglês).
O que é o Plano Quinquenal da China e por que ele é importante?
O Plano Quinquenal é um documento estratégico que orienta o desenvolvimento econômico e social da China a cada cinco anos. Criado em 1953, ele define metas e prioridades para setores-chave, como indústria, tecnologia, infraestrutura, energia, educação e meio ambiente.
Cada plano é elaborado pelo governo central e aprovado pelo Congresso Nacional do Povo (o legislativo nacional chinês), funcionando como um "mapa" para as políticas públicas e investimentos do país. Além de fixar objetivos econômicos — como crescimento do PIB, geração de empregos e inovação —, os planos também refletem a visão de longo prazo do país, alinhada às diretrizes políticas do PCCh.
O 15º Plano Quinquenal (2026-2030), atualmente em preparação, é considerado crucial porque consolidará metas de modernização socialista, ampliará a liderança em tecnologia e indústria de ponta e fortalecerá a posição da China na economia global. Também abordará desafios internos, como envelhecimento populacional, transição energética e competição com os Estados Unidos.
Assim como o Plano Plurianual (PPA) no Brasil, o Plano Quinquenal chinês organiza recursos e investimentos, garantindo previsibilidade às políticas econômicas e sociais.
O que é e como funciona o Politburo?
O Politburo (abreviação de "Bureau Político") é um dos principais órgãos de liderança do PCCh. Ele é responsável por decisões estratégicas sobre economia, política interna, relações internacionais e reformas estruturais.
Composto atualmente por 24 membros, é liderado pelo secretário-geral do PCCh, Xi Jinping, que também preside o país. O Politburo se reúne regularmente para avaliar a situação nacional e definir políticas de alto impacto.
O Comitê Permanente do Politburo, um núcleo reduzido com apenas sete membros, concentra as decisões mais urgentes e estratégicas, como pacotes de estímulo e diretrizes econômicas.
Na prática, o Politburo funciona como o "centro nervoso" da política chinesa: todas as grandes decisões, como as medidas econômicas recentes e a formulação do 15º Plano Quinquenal, passam por ele. Diferente do sistema brasileiro, ele centraliza as diretrizes políticas e econômicas sob a liderança do Partido, que comanda o Estado.