A realização da COP 30 em Belém do Pará é um marco simbólico e estratégico. A primeira conferência que vai debater crise climática e sustentabilidade sediada em solo Amazônico, bioma que é o coração das discussões sobre biodiversidade e palco de profundas transformações culturais. Esse cenário que aliás nos impulsiona a ampliar o debate e reconhecer um vetor essencial, por vezes negligenciado nas negociações técnicas: a cultura como força motriz da ação climática.
Durante décadas, a crise climática foi abordada principalmente por prismas científicos e econômicos. No entanto, são as expressões culturais, a arte, os saberes tradicionais, a música, o patrimônio, que traduzem as realidades, dando rosto e voz ao desafio. A cultura conduz o fio da narrativa que nos conecta com o território, que transforma a luta ambiental de uma obrigação em um valor coletivo. No Ministério da Cultura, temos a convicção de que não se pode alcançar a resiliência climática sem mobilizar este poder narrativo e simbólico.
Esta não é uma agenda teórica. Estamos agindo. Internacionalmente, sob a liderança da Ministra Margareth Menezes, o Grupo de Amigos da Ação Climática Baseada na Cultura age para inserir a diversidade cultural no centro da diplomacia climática. Em resposta à emergência no Rio Grande do Sul, o programa Retomada Cultural RS demonstrou nosso compromisso na prática, indo além da reconstrução de equipamentos para investir em pontos de cultura, comunidades quilombolas e, de forma inovadora, desenvolver os primeiros protocolos de resiliência climática para acervos culturais do país. Paralelamente, criamos diretrizes de sustentabilidade para eventos, visando reduzir sua pegada ecológica, o indicador do impacto gerado pelo consumo de recursos e pela produção de resíduos.
Contudo, nosso maior e mais urgente aprendizado emana dos povos originários e tradicionais. Eles são os guardiões de saberes milenares que harmonizam existência humana e floresta em pé. Suas cosmovisões, que entendem a natureza como sujeito de direitos e não como mercadoria, seus sistemas agroflorestais e sua medicina tradicional são tecnologias sociais de altíssima sofisticação e eficácia comprovada. Sua cultura não é apenas um patrimônio a ser preservado; é uma solução viva e ativa para a crise planetária.
A COP 30 na Amazônia é o palco ideal para o mundo ouvir e aprender com esses mestres e mestras. A transição para uma sociedade de baixo carbono exige, inevitavelmente, uma transição cultural. Precisamos substituir a narrativa de exploração pela ética do cuidado, e isso também se faz com poesia, com cinema, com o canto dos povos da floresta e com a força de seus rituais. A cultura, em sua essência, é o antídoto contra a indiferença e uma potência de uma nova trilha de desenvolvimento possível e sustentável. Ela nos lembra que a luta pelo clima é, no fundo, a luta pela vida. E é na Amazônia que essa verdade ecoa com mais força.
*Márcio Tavares é doutor em arte pela UnB e mestre em História pela UFRGS. Atualmente é Secretário Executivo do Ministério da Cultura.
**Este artigo não reflete, necessariamente, a opinião da Revista Fórum.